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Arquivologia 2.0: a informação digital humana 1ª Edição Excertos de um Arquivista 2.0 no mundo digital Charlley Luz Prefácio de Vanderlei Batista dos Santos Charlley Luz é publicitário e bacharel em Arquivologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pós-graduado em Gerência de Sistemas e Serviços de Informação pela FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), onde é professor convidado de descrição arquivística no curso de Gestão de Documentos. Especialista em projetos de Ciência da Informação em ambientes digitais, iniciou sua vida profissional como atendimento, mídia e planejamento em agências de propaganda por mais de dez anos, onde participou de campanhas publicitárias para empresas e organizações do Rio Grande do Sul. Na área de internet trabalhou na wwwriters com a elaboração de projetos, no desenvolvimento e coleta de conteúdo, além de gerenciar projetos web e estruturar arquitetura de informação e conteúdo para clientes como Sebrae/RS, prefeituras municipais e governo estadual do RS. Na área empresarial atuou em clientes como Companhia Zaffari de Supermercados, Calçados Hush Puppies, Metalúrgica Mor, entre outros. Em 2006 passou a exercer a função de Consultor Web junto ao Grupo Conectt, desenvolvendo arquitetura de informação e de interface, além de consultoria em empresas de grande porte. Como Consultor de Ciência da Informação e Comunicação da Plena Consultores trabalhou em projetos que são referência em ambientes digitais. Atualmente realiza também pesquisas na área de Ciência da Informação como web semântica, metadados e arquitetura de informação. ISBN: TÍTULO: AUTOR: 978-85-62418-99-0 Arquivologia 2.0: a informação digital humana. Excertos de um arquivista 2.0 no mundo digital LUZ, Charlley EDIÇÃO: 1ª ANO DE EDIÇÃO: 2010 LOCAL DE EDIÇÃO: FLORIANÓPOLIS "2 !3 TIPO DE SUPORTE: PAPEL PÁGINAS: 116 EDITORA: BOOKESS EDITORA Arquivologia 2.0 Charlley Luz Editora Bookess 2010. ! ! Atribuição. Você permite que outras pessoas copiem, distribuam e executem sua obra, protegida por direitos autorais – e as obras derivados criadas a partir dela – mas somente se for dado crédito. ! Compartilhamento pela mesma Licença. Você pode permitir que outras pessoas distribuam obras derivadas somente sob uma licença idêntica à licença que rege sua obra. "4 Sumário I. Sobre o ARQUIVISTA 2.0 ...........................................20 1. A tecnologia é nosso registro histórico? ....................24 2. A Meta-preservação da informação digital primitiva 27 3. O blog é uma informação arquivística? ........................30 4. Um pouco de Gestão do Conhecimento e Arquivologia .. 33 5. Uma contextualização da Gestão do Conhecimento ....40 II. ARQUIVOLOGIA 2.0 – APLICAÇÃO PRÁTICA ......47 6. Um pouco sobre Arquitetura de Informação, Portais e Arquivistas ....................................................................48 7. A Arquivística e a Arquitetura da Informação: similaridades possíveis .................................................53 8. Da descrição ao menu do site: nem todo mundo é arquivista ....................................................................57 9. Foco no usuário: pense no usuário antes dele precisar de você ........................................................................61 10. Análise heurística como comparação de qualidade....63 11.Como a interação toma conta do digital .......................67 12. A nuvem da internet está na cabeça do arquivista 2.0 .... 70 III. O Arquivista 2.0 e a Gestão do Conhecimento.............73 !5 13. GC: acompanhando os resultados .............................74 14. Inovação sem blábláblá ............................................77 15. Taxonomia: simples assim. .......................................81 16. A organização da informação enquanto tendências: folcsonomias ..............................................................85 17. Folcsonomia: da salada de frutas à estruturação da informação ...............................................................88 18. Memória Corporativa traz ganhos às empresas .........93 IV. 19. Arquivistas nos portais ...............................................98 A emergência da colaboração e a construção de portais corporativos....................................................99 20. O papel do arquivista, profissional da informação, nos portais corporativos..................................................101 21. Tecnologia da Informação na gestão do conhecimento e informação orgânica ..............................................107 22. Tem informação de gestão? Coloca no cockpit! ......109 Posfácio ...................................................................................112 Autores que o Arquivista 2.0 lê...............................................119 "6 Prefácio A ideia de instituição e profissional 2.0 é uma analogia ao advento da web 2.0. Termo cunhado em 2005, por Tim O´reilley, no artigo “What´s web 2.0?” Dentre as várias mudanças ou, se preferir, evoluções apontadas entre a web tradicional e a 2.0 estariam: a opção pelo uso do Napster, da Wikipedia e do blogging, ao invés de, respectivamente, buscas no mp3.com, na Britannica online ou na criação de sites pessoais. Esses novos comportamentos vão mais além, porém nos limitaremos a dois aspectos preponderantes. A opção pelas estruturas de tagging (folcsonomias, ou seja, classificação colaborativa, com palavras-chave eleitas livremente) abandonando a de diretórios (taxonomias) para a organização de informações e a preferência pelas ferramentas de participação (wikis) ou invés de simples publicação. Por este princípio norteador, se as tecnologias de comunicação ultrapassaram o funcionamento de mão única, qual seja apenas a divulgação da produção institucional, e passaram a focar a participação do público (específico ou geral) no processo de elaboração e de revisão daquilo que a instituição produz, então, essas mesmas instituições e seus profissionais têm que, também, se preparar para este novo mundo 2.0, onde a regra principal é a colaboração. Apesar de recente, a aplicação deste conceito não é novidade em inúmeras áreas do conhecimento, sejam !7 em nível acadêmico, seja empresarial ou governamental. Basta navegar um pouco na internet para perceber as várias aplicações teóricas e práticas de ferramentas do tipo wiki, blogs para difusão e debates em projetos, programas e pesquisas em desenvolvimento. Representante de uma geração que acredita que o papel do arquivista vai além das quatro paredes do arquivo e de sua vinculação institucional e que, mais importante, se inquieta e nos inquieta com a exposição de suas idéias, Charlley Luz nos apresenta esta versão atualizada e ampliada de seus textos disponíveis no blog Arquivista 2.0 (http:// arquivistadoispontozero.wordpress.com/). No aspecto teórico, o autor opta por fugir do academicismo, embora não se furte às citações essenciais à ratificação de algumas de suas ideias, simultaneamente oferecendo ao leitor a possibilidade de consultar as referências e aprofundar as informações aqui registradas. Desta feita, apesar de expor-se a uma crítica de forma advinda de leitores mais criteriosos, também torna a leitura mais dinâmica visto que reduz a necessidade de recorrência às referências bibliográficas e leitura complementar das citações de outrem. O autor optou por usar a linguagem típica dos blogs e demais ferramentas de comunicação da web 2.0. São textos curtos, com linguagem coloquial, sintética, objetiva e de fácil leitura. Falta profundidade na discussão dos temas? Talvez. Mas seria este o momento? A Arquivologia vem passando "8 por um lento processo de evolução devido, muito provavelmente, ao seu reconhecimento como disciplina ser recente, embora suas bases práticas existam há vários séculos, conforme apontam especialistas da área como Hélio Lodolini e Antonia Heredia Hererra. Tal fato tem dificultado a ocorrência de revoluções do conhecimento da área que, até a década de 1970, no país, era tida quase que exclusivamente como a técnica de organizar papéis velhos em depósitos para que pesquisadores pudessem consultar, interpretar e escrever a história. Os conceitos de gestão de documentos, três idades e, mais modernamente, documentos digitais e informação arquivística, trouxeram nova vida à pesquisa da área e a, também, identificação dos arquivos como instrumento de apoio à tomada de decisão nas atividades diárias da instituição, bem como fonte de informação para o planejamento corporativo. A revolução teórica veio pela tecnologia. Entretanto, mesmo após mais de meio século da criação destes conceitos há quem ainda defenda a exclusividade do papel do profissional de arquivos como guardador de papéis, ou, de forma ufanista, como preservador da memória. Tal visão entende o arquivo como o resultado do ciclo vital e o arquivista como o profissional que atua nos arquivos permanentes, ignorando seu papel essencial no cotidiano institucional. O papel dos profissionais da arquivologia se restringe a isso? Acredito peremptoriamente que não. Apenas para ilustrar estas possibilidades e amplitude de atuação, há quem mencione as possibilidades de relação da Arquivologia com a Semiótica (Manuel Vazquez), outros !9 profissionais apontam sua proximidade com a Ciência da Informação (José Maria Jardim, Maria Odila Fonseca, Armando Malheiro da Silva, Fernanda Ribeiro), outros com a Gestão do Conhecimento (Vanderlei Batista dos Santos), além das já consagradas relações da Arquivologia com História, Direito e Administração. Também se sobressai seu papel preponderante na gestão dos documentos digitais (Luciana Duranti, Terry Cook, Rosely Rondinelli, Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos) e na relação com as tecnologias da informação e comunicação, o que nos traz ao Arquivista 2.0 proposto por Charlley Luz. O profissional que sofre impacto da evolução da tecnologia e das relações dessa com os sistemas de comunicação. Trabalhar com os documentos arquivísticos é muito mais que classificá-los, avaliá-los, armazená-los, preservá-los ou eliminá-los e oferecer ferramentas de busca, preocupando-se com o documento em si e não com o uso das informações nele contidas. O foco da formação e da atuação profissional deve ser o objetivo final da disciplina: concessão de acesso aos documentos em todo seu ciclo de vida. Todavia, os profissionais da área têm que ser convencidos deste fato e, ainda mais, atuar neste sentido, buscando a especialização que não existe nos cursos de graduação, cujo padrão é a formação generalista na área, tamanho o leque de ação possível. Como discutir de forma adequada e aprofundada temas como gestão do conhecimento, arquitetura da informação e preservação digital fora de uma especialização ou de uma disciplina específica? Quantas novas disciplinas teriam que ser criadas para, por "10 exemplo, contemplar uma possível candidatura do arquivista a perito forense em Documentoscopia, com base em seus conhecimentos de Diplomática, aprimorados por estudos sobre grafotécnica e perícia digital? No escopo de busca de conscientização e convencimento é que este livro foi escrito. É um primeiro passo no sentido de clarificar abordagens ainda mais novas de atuação do profissional. Assim, o autor optou por sucumbir à necessidade de abranger a amplitude do tema, mesmo que tal fato inviabilizasse, por outro lado, um aprofundamento. Tal escolha acaba por resultar numa vantagem, qual seja permitir que a mensagem do livro alcance profissionais não especializados. Em evento recente, Suely de Brito Clemente Soares (III Seminário em Ciência da Informação, Londrina, 2009: “Gerações XYZ, web 2.0 e a comunicação científica”) traça um perfil da evolução das comunicações científicas e os profissionais, demarcando: a) veteranos (nascidos até 1945); b) babyboomer (nascidos entre 1946 e 1969); geração x (entre 1970 e 1980); geração y (1981 a 1990); geração z (nascidos a partir de 1991, geração digital, redes sociais, mobilidade wi-fi). Ela ressalta que apesar destes cortes de gerações, existem aqueles que são considerados “trans”geração, porque são cronologicamente de uma geração, mas se integraram perfeitamente a outra. Boa parte dos profissionais da arquivologia brasileira está inserida nas gerações babyboomer e “x”, mas podem ser considerados “trans”? Ou seja, estão preparados para !11 as demandas profissionais da geração “z”? Suely Soares ressalta o óbvio ignorado por muitas instituições. Os fatores que influenciam a relação pessoal com as tecnologias vão além das gerações e abrangem: motivação, ambiente favorável e situação financeira que são individuais, mas podem ser observadas pelas empresas. A maior parte dos profissionais no país ainda usa as ferramentas disponíveis apenas para difundir ou para ler o que os outros estão escrevendo sobre si ou sobre suas áreas de interesse, esquecendo-se que o principal papel da web 2.0 é a colaboração, por meio da troca de ideias ou da produção coletiva. Será que esta chamada “geração z”, que já nasceu no tempo das redes sociais, produzirá os Arquivistas 2.0 ou estaremos, dentro de algum tempo, com os profissionais mais antigos caracterizados como “trans” e atuando dentro das novas demandas da área? O que fazer para nos tornamos Arquivistas 2.0? Este caminho, apesar de evidente, não é fácil de ser trilhado. Alguns podem até perguntar se é nesta direção que a profissão deve ir. O futuro da profissão, evidentemente, depende dos profissionais e de suas associações de classe, bem como das instituições normatizadoras que, em última instância, propõem como as atividades técnicas devem ser executadas. Assim, há muito a ser estudado, questionado, proposto e executado. Acredito, porém, que este livro é um primeiro passo para se questionar e repensar a atuação e a formação do profissional neste novo mundo 2.0. "12 Por sua coragem em propor e submeter à crítica dos pares uma temática tão nova e instigante, parabéns Charlley Luz! Brasília-DF, 25 de agosto de 2010. Vanderlei Batista dos Santos Arquivista e mestre em Ciência da Informação. Autor do livro "Gestão de documentos eletrônicos: uma visão arquivística" (2002), co-autor e organizador do livro “Arquivística: temas contemporâneos” (2007, e de vários outros artigos técnicos arquivísticos. É componente da Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos do Conselho Nacional de Arquivos e Analista em Documentação e Informação Legislativa da Câmara dos Deputados. !13 Introdução Os textos aqui reunidos são o resultado de uma prática profissional, da tentativa de adaptar a arquivologia, como ciência, para aplicação pragmática no mundo 2.0. Exatamente por esta característica não é um livro acadêmico, o que me desobriga a fazer citações para justificar minhas argumentações, claro que as utilizo sempre que considero necessário. As justificativas vêm exatamente desta abordagem pragmática, testada e levantada durante a minha atuação profissional. Por isso a linguagem deste livro é fácil, ancorada nesta práxis. Tudo o que é 2.0 é partilhado, por isso este livro é uma partilha de um posicionamento. Este livro só existe para trazer novos elementos que possam criar uma nova visão da arquivologia como registro das informações humanas, sejam elas corporativas ou pessoais e gerar esta discussão. A informação 2.0 é resultado da inteligência coletiva e este livro trava comparações entre a arquivologia e as atuações frente a este mundo 2.0. Fala-se em arquitetura de informação, inovação, intranets e portais corporativos, gestão do conhecimento e processos colaborativos. Mostra-se como se dá a relação entre interfaces, informações, taxonomia e folcsonomia. Enfim, este é um convite à reflexão de qual papel o arquivista e arquivólogo tem no mundo 2.0. E com o "14 objetivo maior no resgate, registro e uso das informações digitais primitivas. Tudo agora é 2.0. Isto é, tudo agora é diferente, novas perspectivas, paradigmas e visões. Com essa onda 2.0, até as mais antigas instituições têm de repensar sua atuação. Empresas estão com o mesmo poder que consumidores nas redes sociais. Igrejas usam o poder das mídias para atrair fiéis. Novas crenças surgem trazendo visões de mundo diferenciadas. Ninguém mais está só. Com a nossa vida é a mesma coisa. Agora temos uma arquivologia onde o arquivista não é mais um ser iluminado trancado em sua sala e lendo documentos antigos. Eles ainda persistem e vão continuar, mas agora a arquivologia está contra a parede. Contra ela a pressão de termos de pensar nas informações digitais. Temos de cada vez mais prevermos como essas informações serão tratadas, mobilizadas, preservadas, disponibilizadas e indexadas. Nosso desafio é muito maior do que se pensa. O preço de não atentarmos a isso é termos uma parte da história (entre os anos 1990 e 2020) perdida, por conta da falta de políticas que tratem as informações digitais. Por que 2020? Por que este prazo de 10 anos é o ideal para olharmos para trás, nestes quase 30 anos de informações digitais, e vermos como vamos resgatá-las e guardá-las e termos um plano plurianual de ações que garantam o tratamento histórico das informações a partir de 2010. Além das técnicas de preservação digital (migração de mídia, de plataforma, etc.) temos o !15 desafio de pensar na estruturação destas informações. Temos ao nosso favor técnicas de GED, a Arquivística Diplomática Contemporânea, o Modelo de Requisitos para Sistemas Informatizados de Gestão Arquivística de Documentos - E-Arq do Conselho Nacional dos Arquivos - Conarq. Mas além dessas técnicas, agora temos, também, as informações humanas geradas nas redes sociais, nos ambientes corporativos e nas funcionalidades como blogs e wikis. Mas parece-me que ainda faltam as pessoas, pareceme que precisamos sensibilizar os colegas arquivistas a não terem medo da tecnologia da informação, de pensarem em interfaces de relacionamento com as informações que sejam adequadas, que é necessário ter uma base chamada gestão do conhecimento e que precisamos nos posicionar. Em nome do registro da história inicial das informações digitais e em nome da sobrevivência da arquivologia como ciência. Este livro é um manifesto. Assine este manifesto também. Pense na arquivologia 2.0. Ela existirá se você pensar nela. Este livro é um chamado, para garantirmos o registro da história que vivemos agora. Os textos estão agrupados de uma forma que possibilita um aprofundamento horizontal sobre seus temas. SOBRE O ARQUIVISTA 2.0, é a parte do livro onde lanço o manifesto em nome da preservação das informações digitais. No capítulo ARQUIVOLOGIA 2.0 – APLICAÇÃO PRÁTICA, apresento algumas atividades desempenhadas através de preceitos arquivísticos no universo das informações humanas digitais. No capítulo "16 O ARQUIVISTA 2.0 e a GESTÃO DO CONHECIMENTO é onde faço a definição os componentes de GC e a estruturação dela através de uma visão arquivística. Na área ARQUIVISTAS NOS PORTAIS, a importância da participação desse profissional neste tipo de ambientes digitais. Aviso A Arquivologia 2.0 é beta, ou seja, está em construção por seus envolvidos e comportará temas que indicam aos profissionais do tratamento de informações orgânicas como desempenhar suas atividades, organizando em interfaces de ambientes digitais a relação dos usuários nestas interfaces, geradores e consumidores dessa informação. !17 Quadro da Transdiciplinaridade da Arquivologia 2.0 ! O Quadro da Transdisciplinaridade da Arquivologia 2.0 apresenta por ordem matricial os temas, técnicas, "18 tecnologias e ciências que constroem a formação do Arquivista 2.0 como o profissional responsável pela informação digital humana registrada nos processos corporativos. Mas ela pode ser mudada por você. !19 I. Sobre o ARQUIVISTA 2.0 Neste capítulo, a tentativa não é encerrar uma discussão, mas sim iniciála. Aqui se pretende estabelecer um pouco o objeto de trabalho do arquivista 2.0, com o intuito de criar pontes entre a realidade das informações digitais e o objeto tradicional da arquivística, a informação como prova de ação. Aqui lanço o Manifesto do Arquivista 2.0, explorando esta amplitude de trabalho nas informações humanas digitais. O mais importante é sabermos de nossa missão neste mundo de novidades, para sermos arquivistas 2.0 e não arqueólogos da informação num futuro próximo. "20 1. Manifesto Arquivista 2.0: especialista em informação humana digital Muito se fala no mundo 2.0 – empresa 2.0, web 2.0, trabalhador 2.0. O termo Web 2.0 é utilizado para definir uma nova etapa da World Wide Web, que reforça os conceitos de colaboração dos internautas e oferta de serviços on-line. Não temos mais uma plataforma única, mas sim um conjunto de aplicações, muitas vezes gratuitas e que funcionam de forma autônoma, mas que podem ser utilizadas em diversos ambientes, como instituições de ensino, empresas e governos. Esse novo mundo 2.0 é espelhado através da informação orgânica, registro da inteligência coletiva, das decisões das pessoas e instituições e do relacionamento profissional entre indivíduos. É a prova da ação humana e o registro de suas atividades nos processos. Aqui podemos tecer paralelos com a realidade da arquivística, que nas suas concepções mais clássicas trata o objeto dela mesma como o registro das provas das ações das instituições. Parece-me que o foco na arquivística 2.0 deixa de serem organizações e passa ser a ação humana. Tanto é fato que a gestão de conhecimento corporativo, por exemplo, hoje registra o que está acontecendo entre as pessoas nas empresas e entre elas e as próprias instituições, através da história oral em projetos e o registro da tomada de decisão só para citar !21 dois exemplos. Este é o diferencial competitivo maior das empresas hoje, empresas que registram o conhecimento são mais destacadas em inovação e são mais valorizadas no mercado e na sociedade. Mais do que nunca o e-mail hoje é o documento mais importante nas empresas, é uma evidência sempre considerada. Além do mais, a colaboração corporativa, onde os indivíduos relacionam-se numa comunidade virtual realizando determinado tipo de troca de informações, atividade, processo ou trabalho é hoje o destaque no mercado corporativo. Essas novas atividades de geração de informação também geram novos perfis de pessoas, os Prosumers, ou seja, aquelas pessoas que produzem e consomem conteúdo e informações ao mesmo tempo. Essa relação se dá em arenas de relacionamento que utilizam ferramentas de web 2.0 como os blogs, wikis, microblogs e ambientes de troca de arquivos e de registro do conhecimento como intranets e portais corporativos. Aqui o arquivista 2.0 tem um papel fundamental e deve pensar na classificação e estruturação dessa informação, além da própria temporalidade, pois no ambiente digital sempre temos de lembrar a preservação digital e o tamanho limitado dos servidores para registrar as informações. O arquivista 2.0 deve entender essa informação orgânica e ver o que se deve fazer com o conteúdo gerado em blogs, wikis e nas ferramentas de interação humana no mundo digital. Este parece ser o grande desafio e ponto de partida do arquivista 2.0. Afinal, "22 como é o versionamento de conteúdo num documento gerado num workflow colaborativo? Quem é o autor? O último a participar do processo ou todos que de alguma forma colaboram na elaboração do conteúdo devem ser considerados autores? E a classificação e indexação? Os vocabulários controlados hoje são suficientes para abarcar toda a amplitude temática de uma instituição? E o descarte? Num fluxo de criação de documento há de se preservar várias versões ou somente a última? Ainda temos de pensar no acesso, armazenamento e busca desses conteúdos. Os desafios são imensos. E o que fazer com as redes sociais e as discussões registradas nos tópicos de fórum? Microblogs como o Twitter (rede de publicação de microposts) representam não só o que as pessoas pensam, mas também o que sentem em relação a determinado assunto e este sentimento sempre é aberto a interpretações. E a folcsonomia (a etiquetagem de informação realizada pelos próprios usuários), serve só para o usuário ou tem um sentido mais amplo, que pode ser adequado a outros usuários? Temos de pensar cada vez mais na relação direta e orgânica das pessoas e das informações, só possível nesses ambientes digitais. E os metadados? Eles são objeto de estudo nas faculdades e de trabalho para quem lida com informações digitais. O projeto internacional Interpares de Luciana Duranti (do qual sou admirador), comungado por arquivistas no mundo todo e que busca, por exemplo, trabalhar a validação e autenticidade das informações digitais preocupa-se com !23 eles há muito tempo, mas de fato os metadados fazem parte do trabalho dos arquivistas digitais? Isso não deveria ser uma novidade para nós, arquivistas, profissionais responsáveis pelas informações orgânicas, geradas nas decisões e explicitadas em registros. Na verdade, este novo comportamento 2.0 já havia sido pensado desde o início da web, com todo mundo trabalhando em rede e trocando informações de forma multifacetada através de hiperlinks. Quando Tim Berners-Lee criou a www (web), buscava uma forma mais fácil de trabalhar colaborativamente com outros cientistas. Assim, criou o hiperlink textual que, até então, era algo que só existia na teoria. Por isso me pergunto: todo mundo sabe o conceito clássico de documento (salve Schelemberg!)? Mas, olhado ali na frente, ali na esquina com a realidade de virtualização e digitalização da informação – o que é documento? Devemos rever seu conceito como, por exemplo, se revê hoje os direitos autorais? Com certeza esse deve ser um ponto de atenção para os arquivistas 2.0. 1. A tecnologia é nosso registro histórico? Tenho pensado muito sobre a tecnologia. Ela é resultado da inventividade e da capacidade de inovação do ser humano. Fazendo uma rápida análise etimológica da palavra tecnologia, vemos que a primeira parte vem do termo técnica, expressando a ideia de arte ou "24 habilidade. Já “logia” vem de Logus que deriva do grego e significa palavra, estudo ou conhecimento. Com a tecnologia temos o melhor caso de registro da história da evolução e inovação, por isso acredito que a evolução da tecnologia é a própria história da humanidade, ou seja, focada na ação humana. A tecnologia representa também a quebra de paradigmas, onde sempre há possibilidade de novas descobertas e suas aplicações. Do átomo fomos ao elétron, e daí cria-se a nanotecnologia. Acredito que o arquivista 2.0 não pode ter medo da tecnologia. Não precisamos saber da nanotecnologia, mas precisamos, no mínimo, dominar o vocabulário da área e ainda ter capacidade de entender as tecnologias da informação. Afinal, precisamos dela cada vez mais em nosso cotidiano, seja elaborando mecanismos de descrição arquivística, técnicas de localização de documentos ou até sistemas de registros de protocolo. A tecnologia da informação sempre será um conjunto de requisitos que são atendidos de formas diversas por uma interface de sistema, sendo assim um mecanismo de interação do humano com o computador. Logo, o arquivista 2.0 não precisa programar um sistema, mas deve ter claros os requisitos de seu “negócio” (esta é a linguagem utilizada), e também deve saber o que é arquitetura tecnológica, arquitetura de informação e arquitetura de software, por exemplo. Como um cliente assíduo das áreas de TI (Tecnologia da Informação), ele deverá ser capaz de saber solicitar requisitos, de validar !25 documentações como especificações funcionais e até acompanhar o gerenciamento de projetos. A tecnologia envolve a razão e isto é uma forma de conhecimento. E hoje não se vê mais a gestão do conhecimento, de arquivos e de conteúdos sem a tecnologia. Aliás, sabe-se que estas gestões são implementáveis somente através de sistemas que apoiam seu processo de geração, classificação, utilização e armazenagem. Tecnologia e conhecimento humano sempre andaram juntos. E você, acha que não seríamos humanos sem a tecnologia? "26 2. A Meta-preservação da informação digital primitiva Acredito que uma política de preservação digital básica é a estruturação dos metadados de um ambiente de informações digitais. E você, já tem um padrão de descrição de seus arquivos digitais? Através de metadados definidos conseguiremos garantir a manutenção da informação. Nos ambientes digitais as estruturas básicas de metadados estão representadas por instrumentos de descrição da informação, através de diferentes formas como o MARC (Machine Readable Catalog Format) para os bibliotecários, o EAD dos records managements dos EUA ou iniciativas de padronização internacionais como o TEI (Text Encoding Initiative) ou o que eu adoto, o DC (Dublin Core) para sites e portais. Recentemente fiz um trabalho para uma instituição de arte contemporânea, onde adotei no planejamento da estrutura os metadados do portal corporativo (uso corrente) parte da tabela de classificação da instituição, elaborada no arquivo histórico (permanente). Esta estruturação possibilitou a criação de uma área de quarentena, onde os dados digitais do arquivo intermediário (dentro do portal) serão tratados tecnicamente e serão registrados no permanente, gerando assim um fluxo desde o arquivo corrente, no !27 portal, até a base de dados no arquivo permanente. Inicialmente havia proposto a utilização do CDWA (Categories for the Description of Works of Art) mas, neste caso, utilizamos uma abordagem de idades de informações, mais adequada a utilização dos metadados da tabela de classificação do arquivo histórico. Outra facilidade nesta estruturação é que os arquivistas ainda podem contar com as principais normas para descrição arquivística, a ISAD (G) - norma geral internacional de descrição arquivística - e a ISAAR (CPF)- norma internacional de registro de autoridade arquivística para entidades coletivas, pessoas e famílias - como opção. Elas são adequadas para criação de bancos de dados próprios e adaptáveis para plataformas tecnológicas configuráveis. A descrição arquivística cria metadados das informações contidas em documentos. O e-ARQ Brasil, por meio da Resolução n° 32, de 17 de maio de 2010 aprovou o modelo de metadados para Sistemas Informatizados de Gestão Arquivística de Documentos - e-ARQ Brasil. Essa é uma boa prática para garantir a interoperabilidade de conteúdo e para a identificação do contexto funcional da criação do conteúdo corporativo. A forma como se estrutura os dados mostra muito a respeito deles. E mais, garante futura migrações de linguagem tecnológicas e reaproveitamento do conteúdo em outras plataformas. "28 Escolha um padrão e registre suas informações para o futuro. Estruture os metadados de seus sistemas e das interfaces que você cria ou trabalha. !29 3. O blog é uma informação arquivística? Um pouco da tentativa de fazer futurologia. E você, sabe como será a informação digital daqui a 30 anos? Esses dias percebi que estava comparando os manuscritos, ou cartas e memórias dos arquivos pessoais com os registros orgânicos deixados nos blogs e comunidades da web. Acredito que ambos tratam de informação pessoal. As cartas são registros e não um documento na concepção da palavra. Documentos registram as tomadas de decisões e envolvem a comprovação de algo e cartas tem um cunho pessoal, porém isso põe em dúvida se este tipo de conteúdo seja uma preocupação arquivística. As cartas podem não ser provas, mas contextualizam um período de tempo e terão importância histórica. Pense num blog corporativo, por exemplo, um blog do presidente, muito comum em portais e intranets. Uma alteração societária ou novo rumo dos negócios realizado há alguns anos pode ficar à disposição de novos colaboradores e facilitar possíveis pesquisas históricas no futuro. Do ponto de vista de pessoas (como no exemplo das antigas cartas) vê-se o esforço da inteligência coletiva (só possível em humanos) em deixar sua história registrada na web, mesmo que isso não seja o objetivo "30 principal. Hoje o universo corporativo já adotou o blog como ferramenta de registro e a informação digital é utilizada na maioria dos processos produtivos. O blog é um tipo de registro que pode ser comparado às cartas ou memórias de um arquivo pessoal. Antigamente, a pena e o nanquim não eram para todos, o analfabetismo era grande e o que nos resta são registros de gente ilustre e intelectuais do passado. Mas hoje o processo é mais amplo e coletivo. Acredito que a facilidade da informação aumentará consideravelmente a quantidade e variedade de pensamentos de nossa época. Haverá registros de opiniões diversas sobre temas tão variados do mundo todo. Imagine a quantidade de registros de informação em blogs sobre o tema aquecimento global? Como será a pesquisa sobre este tema daqui a trinta anos. A informação digital quebra os paradigmas para os arquivistas e bibliotecários nos registros atuais. Mas os historiadores serão garimpeiros ou arqueólogos? Como vão pesquisar fontes para seus estudos num mundo multifacetado como são as teias da web? Este é um importante ponto de atenção para os profissionais. Talvez para os biógrafos as pesquisas sejam mais fáceis, pois um blog registra uma linha de tempo de um indivíduo. São registros de seus pensamentos, ações, ideias e sentimentos. E você, o que acha que será das nossas informações digitais de hoje, da era da explosão informacional e dos primórdios da informação digital daqui a trinta anos? !31 "32 4. Um pouco de Gestão do Conhecimento e Arquivologia Na terceira onda de desenvolvimento da humanidade o conhecimento é a principal forma de capital. Você e eu podemos usar o mesmo conhecimento ao mesmo tempo. “Este fato, por si só, derruba o alicerce dos pressupostos tradicionais acerca do capital e abre um rombo na própria definição de economia como a ciência da alocação de recursos escassos” como disse Alvin Toffler (o futurista com maior credibilidade e influência internacional, que tem assessorado governos e importantes empresas em todo o mundo). As organizações e a ciência administrativa notaram isto e se fez, no universo corporativo, a necessidade de novos tipos de empresas, que trabalhem internamente o fluxo das informações de forma horizontal. O capital intelectual passa a ser um ativo das empresas e precisa ser indicado em seus balanços com outros elementos intangíveis como a marca (branding). O capital intelectual passa a ser um diferencial competitivo. As empresas que tratam este conhecimento são mais valorizadas que as empresas que não fazem a gestão do conhecimento. Com o advento dos ambientes digitais corporativos (portais e intranets) tornou-se possível de forma prática registrar, disseminar, classificar e mensurar o conhecimento. Os serviços devem ganhar espaço e a produtividade deve vir não só com a economia de !33 tempo gasto com tarefas administrativas, mas também ao permitir acesso rápido e fácil aos sistemas corporativos. Nesse ponto, intranets passam a ser chamadas de Portais Corporativos. Segundo a Escola de Administração da FGV (Fundação Getúlio Vargas), a “Gestão do Conhecimento é um processo sistemático, articulado e intencional, apoiado na geração, codificação, disseminação e apropriação de conhecimentos, com o propósito de atingir a excelência organizacional”. Então se trata realmente de planejar, estimular, socializar e utilizar o conhecimento gerado pelos colaboradores das corporações nos processos internos das empresas, sejam elas de qualquer área da economia. O conhecimento pode ser classificado, segundo Nonaka & Takeuchi, reconhecidos professores da Universidade de Hitotsubashi, que criaram o conceito de espiral do conhecimento, em: · Conhecimento Tácito – algo difícil de ser formalizado e comunicado aos outros. · Conhecimento Explícito – formal e sistemático, fácil de ser comunicado aos outros. É importante aos arquivistas lembrarem que se trata de dois tipos de informações registradas e que existem diferentes ferramentas para tanto. E nós com isso? "34 Os arquivistas entram como profissionais da informação em todo processo de planejamento, implementação e divulgação dos programas de gestão de conhecimento nas instituições, sejam elas públicas, privadas ou organizações sem fim lucrativo (ONGs). Planejando No processo de análise da organização, é preciso estudá-la funcionalmente e constatar se alguns passos anteriores e necessários ao início da gestão de conhecimento foram seguidos. Requisitos: ter passado no mínimo pela Gestão Documental e Gestão Eletrônica de Documentos. Outro ponto é estabelecer os níveis de conhecimento a serem registrados através do mapeamento de todo processo de conhecimento da instituição. Isso é muito parecido ao levantamento de informações feito pelos arquivistas num processo de gestão documental, da produção da tabela de temporalidade e quadro de arranjo ou até de seleção/avaliação de documentos. O mapeamento indica quais os mecanismos (ferramentas) melhor utilizáveis para registrar tanto o conhecimento tácito como explícito. O conhecimento explícito é mais fácil de identificar, pois temos muita intimidade com ele através dos sistemas de GED (Gerenciamento Eletrônico de Documentos), que produzem relatórios, atas, memorandos e toda !35 sorte de documentos eletrônicos gerados no curso das atividades dos colaboradores. Para o conhecimento tácito são utilizadas ferramentas de registro de informações com perfil subjetivo. Aqui são utilizados recursos mais atuais como blogs, gerenciamento de correspondência eletrônica (e-mails) e gerenciamento de conteúdo. Implantando No mercado há uma série de softwares criados por empresas que englobam o conceito de Gestão do Conhecimento (GC). É necessário do arquivista certo domínio da tecnologia para possibilitar análise e seleção da ferramenta ideal para a organização para a qual está trabalhando. Ele não precisa programar um sistema, mas deve entender o contexto da criação deste, sabendo como se faz a definição de requisitos de negócio. Pode-se ainda, desenhar (utilizando-se da arquitetura de informação) um sistema de GC customizado para a sua necessidade, utilizando, por exemplo, banco de dados, metadados e outros elementos importantes para a autenticidade de documentos. Como prática, a implantação do programa de gestão do conhecimento pode dividir-se em três fases: "36 1. Gestão da Documentação: através do levantamento e o diagnóstico dos arquivos existentes e das diversas fontes de informações necessárias à organização; 2. Gestão da Informação: através da implantação de sistema de GED e de Gestão do Conhecimento para compartilhar experiências, saberes e conhecimentos individuais ou das equipes. 3. Gestão de Conteúdo: é o gerenciamento de informações, focando a captação, ajuste, distribuição e gerenciamento dos conteúdos para apoio ao processo de negócios de toda a empresa ou instituição. Esses conteúdos podem ser estruturados ou não, procedentes de diversos sistemas, como banco de imagens, Gerenciamento de Documentos (GD), bancos de dados, arquivos nos diretórios das máquinas dos colaboradores ou de qualquer outro arquivo digital como som ou vídeo. Todos estes conteúdos podem ser acessados e gerenciados através de uma interface única baseada em browser (navegador). Um sistema de informação tem como funcionalidades essenciais: - Gestão de usuários (“permissionamento” de acesso por perfis); - Criação, edição e armazenamento de conteúdo em diversos formatos (html, doc, pdf, etc); - Uso de metadados e taxonomias; - Controle da qualidade de informação (workflow); !37 - Classificação, indexação e busca de conteúdo; - Gestão da interface com os usuários (arquitetura da informação); - Gravação das ações executadas sobre o conteúdo. O arquivista deve participar e acompanhar o processo de planejamento da campanha de lançamento e sugerir ao departamento de marketing ou agência da instituição ações participativas e estimulantes. Vale, por exemplo, concurso para escolher a mascote do portal, o nome de determinada área e, claro, o devido treinamento para utilização dos recursos do portal. Concluindo Não existe uma fórmula, mas para o arquivista, aqui então caracterizado como um profissional da informação, surge a possibilidade de integrar e comandar equipes em todas as fases do processo de implantação do programa de gestão do conhecimento, seja antes disso, quando da necessidade de estabelecer a gestão documental, seja na fase de planejamento e levantamento de informações, seja no processo de implementação e até na divulgação e estímulo ao uso da gestão do conhecimento nas corporações. O toque do arquivista Os documentos hoje nascem, são utilizados e morrem no meio digital. Está na hora de pensarmos nisso. Não devemos temer os avanços tecnológicos. Os sistemas de GD (Gestão de Documentos) e GED (Gerenciamento "38 Eletrônico de Documentos) já fazem parte da realidade dos arquivistas e, portanto, é necessário avançarmos mais um passo à gestão do conteúdo e do conhecimento, dando o nosso “toque” de organização a estes ambientes digitais. !39 5. Uma contextualização da Gestão do Conhecimento A entrevista abaixo foi concedida para a revista Melhor – Gestão de Pessoas e resume em muito uma contextualização da Gestão do Conhecimento para aplicação no universo corporativo. Fala-se muito em gestão do conhecimento, mas na prática as empresas vêm conseguindo implementá-la? De fato hoje o mercado pede uma diferenciação entre discurso e prática. De um lado vemos um grande aprofundamento quanto ao tema no universo acadêmico, mas no mundo corporativo ainda temos um caminho a trilhar, buscando trazer a prática da gestão do conhecimento (GC) junto a todos os níveis de colaboradores da empresa, do mais alto diretor às equipes de produção ou de atendimento. O cenário internacional é de avanços significativos nos processos básicos da GC, que englobam geração, armazenagem, gerenciamento e disseminação, além do reuso do conhecimento. O destaque com certeza é o Japão, do “just-in-time”, onde a cultura estratégica está ligada à cultura do próprio país, que é referência mundial em educação e que possui um comportamento natural de cooperação e de pensamento coletivo. No Brasil, apesar de barreiras culturais, também temos cases importantes de Programas de Gestão do "40 Conhecimento, além de iniciativas pontuais que passam pela geração de ideias (para inovação em processos e produtos), intranets e portais corporativos que dão base para a gestão da informação e as universidades corporativas de forma a incentivar o desenvolvimento de novas competências no conjunto de colaboradores. Há de se destacar que as empresas que investem profissionais, verbas e tempo em programas de gestão do conhecimento têm hoje um diferencial competitivo importante e se caracterizam pela inovação e pela participação dos colaboradores. Isso por si só já justifica a preocupação e o investimento realizado. Porém o conceito GC é bastante genérico. Muitas vezes cai-se na solução da tecnologia como elemento chave no processo de GC. Outros acreditam que a GC é a simples remodelagem de processos e até acredita-se que a simples implantação de uma plataforma de ECM (Enterprise Content Management), o antigo GED, é por si só a Gestão do Conhecimento. Eu digo que é tudo isso e mais as pessoas motivadas em partilhar conhecimento. Este é o ingrediente principal, sem as pessoas, a inteligência coletiva, não há conhecimento. Como fazer com que a gestão do conhecimento faça parte de fato da estratégia da organização? Os ganhos com a GC geralmente são intangíveis, como por exemplo, a competência do nível gerencial/tático e da produção, a experiência e conhecimento da empresa por parte dos colaboradores, o uso de sistemas administrativos em novos processos e softwares desenvolvidos pela empresa. Para fora, a GC apoia as !41 relações com os clientes atuais e mercado (aqui temos um viés com a Inteligência Competitiva), relações com fornecedores, além de imagem institucional da empresa nas comunidades onde atua e na mídia. Parte da diferença entre o valor de mercado de uma empresa e o seu valor contábil pode ser explicada pelos ativos intangíveis que, como deu para ver, é constituído em boa parte pelo conhecimento e pelas pessoas. Este é o diferencial competitivo. A maioria das grandes marcas vale mais que seu próprio parque industrial ou ativo recebível. Esta é a diferença entre empresas que tem na sua estratégia o investimento no conhecimento e nas pessoas. O ponto de partida, portanto, é ter uma empresa adequada a esse tipo de orientação, geralmente empresas com estruturas menos rígidas, focadas no resultado, com investimento em retenção de talentos e com o desenvolvimento pessoal. E, claro, ter um “sponsor” (patrocinador do projeto) no nível institucional (diretoria), que acredite neste tipo de organização. Que ações básicas podem ajudar uma empresa a fazer isso? A colaboração e os processos colaborativos hoje são a tônica no universo corporativo. Em meus trabalhos de consultoria vemos que, cada vez mais, os altos gestores querem saber como utilizar a colaboração nas suas atividades. Essa pró-atividade já é um primeiro passo "42 para identificar o “sponsor” e abrir a empresa para possibilidades como criar times de trabalho por competências, evolução de carreiras, desenvolvimento pessoal, auxílio educacional. Em paralelo, é preciso antes estruturar a gestão da informação, uma instituição só consegue gerar conhecimento com a clareza de processos e com as informações organizadas e estruturadas. É a visão de organizar a casa para evoluir. Outro dado importante é quanto à cultura organizacional, pois a GC compreende três ações individuais básicas que são consultar, compartilhar e colaborar e que devem ser incentivadas. Essas três ações atuam conjuntamente, precisando uma grande sinergia e alinhamento da área de gestão de pessoas com as áreas de TI e de Comunicação, visto que as três ações ocorrem através de Ferramentas (tecnologia – usabilidade é a base), Cultura (através de adoção e comunicação – espírito colaborativo) e do Capital Humano (gestão de pessoas – proporcionar o reconhecimento e incentivar atitudes). Como usar essa gestão do conhecimento no processo de educação corporativa? Ou melhor: como otimizar as ações de educação corporativa com a gestão de conhecimento? O primeiro passo é o mapeamento de competências, autoproclamada. Costuma-se utilizar a funcionalidade de páginas amarelas, mas recentemente existem outras !43 formas de indicar necessidades de aprofundar conhecimentos, através da folcsonomia por exemplo. Na folcsonomia o usuário utiliza sua navegação no portal para rotular seus conteúdos de interesse, dessa forma uma nuvem de tags (resultado destes termos) representa o que a inteligência coletiva está pensando e querendo como conteúdo. Este conteúdo pode indicar tendências de áreas de conhecimento que devem ser aprofundados. As páginas amarelas servem para identificar talentos internos na formação de projetos e o cardápio consolidado dos conhecimentos dos colaboradores mostram caminhos para se definir treinamentos e cursos de capacitação ou aprofundamento. Empresas maiores possuem, geralmente, uma universidade corporativa que de fato estrutura cursos de capacitação e de evolução para os alunos, porém a ideia de uma universidade corporativa muitas vezes pode representar um grande investimento (na verdade é um otimizador de investimentos no momento que possibilita uma matriz única de capacitação), então entra neste processo a figura dos projetos pilotos, onde pontualmente numa área ou para determinado perfil de profissionais se desenvolvem projetos de capacitação e de formação, sempre adequando os cursos de acordo com as políticas e estratégias das empresas. Daí se evolui para avaliações 360 ou pesquisas de clima que podem gerar também programas de desenvolvimento e criam demandas para a universidade corporativa. "44 Quais as armadilhas que devem ser evitadas na hora de se pensar em gestão do conhecimento? A tecnologia pela tecnologia. A solução para iniciar ou aprofundar a GC nas empresas não é uma ferramenta tecnológica. Este é um meio, uma arena onde as pessoas colaboram. Uma vez fiz um projeto de intranet de RH para uma montadora e durante o diagnóstico me deparei com uma área onde uma planilha eletrônica coletiva registrava ações de melhoria daquela equipe. De fato eles tinham um processo de registro e recuperação de conhecimento, e faziam isso numa planilha do Excel. Mas esta ferramenta era adequada para a realidade daquela área e estava arraigada na cultura. Obviamente, foi mais fácil criar um mecanismo online, vinculado ao ambiente digital corporativo, o que resultou numa melhora do processo de GC da área. Hoje temos ferramentas que as pessoas estão mais acostumadas, disponíveis nas intranets e que são de fácil utilização, wikis, blogs, redes sociais internas, fóruns, bibliotecas. Porém, sem um processo de adoção, considerando aspectos levantados por Kurt Lewin (três etapas de mudança comportamental), uma ferramenta tecnológica pode ser um fracasso. É necessário conhecer as pessoas e as formas como se relacionam para entender como implementar funcionalidades de GC. Quais devem ser os primeiros passos de uma empresa que quer investir na gestão do conhecimento? !45 Aqui a gerência de conhecimento (muitas vezes vinculada à área de gestão de pessoas) deve ter um grande apoio institucional, para garantir que se crie uma base de trabalho. A partir daí, estruturar a gestão da informação (com taxonomia e efetividade nesta ação), criar canais de colaboração para estimular o processo de geração, armazenagem, gerenciamento, disseminação e reuso do conhecimento e ter uma base gerencial capaz de entender o que fazer com este conhecimento. A filosofia da empresa entra aqui, ela deve querer inovar, vencer junto com seus colaboradores, ter colaboradores-empreendedores, e atingir suas metas estratégicas. Acreditar nas pessoas, investir na retenção de talentos e ter uma estrutura que consiga trabalhar com as diferenças humanas. Essa com certeza é a base. A empresa deve se caracterizar pela inovação e pela participação dos colaboradores. Com esses fatores funcionando, é possível ter condições de criar pilotos de projetos, como de educação corporativa, de comunidades de prática e de inovação na empresa, por exemplo, para ampliar o registro do conhecimento gerado pelos colaboradores nas suas atividades cotidianas. "46 II. ARQUIVOLOGIA 2.0 – APLICAÇÃO PRÁTICA Arquivistas não podem ter medo da tecnologia. Ela está aí para nos servir. É preciso desbravar o contexto de criação de ferramentas tecnológica e sistemas que servem para ser a interface entre as pessoas e as informações e conteúdos. A melhor interface que existe é a interface que não é notada, que pela intuitividade o usuário - gerador e consumidor de informações - consegue realizar o que precisa para o desempenho de atividades. Neste capítulo discuto abordagens possíveis quanto ao papel dos arquivistas no desenho e na arquitetura de informação dos ambientes digitais. !47 6. Um pouco sobre Arquitetura de Informação, Portais e Arquivistas A informação gera o conhecimento quando é relacionada a outros elementos como experiência individual, valores pessoais, contextos e intuição, de amplo acesso e de fácil tratamento. Este processo de transformação ocorre em ambientes digitais que incluem a possibilidade de trabalhar com “streaming media” (conteúdo multimídia), hiperlinks dinâmicos e governanças de conteúdo com variados níveis de permissão. Os portais corporativos, ambientes digitais por excelência, carregam além de arquivos digitais outras fontes de informação, explícitas ou implícitas. Eles são ambientes de instituições ou grupos que usam técnicas de difusão e recolhimento de informações junto a seus públicos através de funcionalidades como enquete, conteúdo dinâmico, blogs e fotologs, além de custodiar documentos orgânicos como relatórios, notícias, memos e instrumentos de comunicação como newsletters (boletim informativo). Esses portais podem ter seu conteúdo atualizado por administradores ou por todos os usuários, onde o conhecimento é construído através do conteúdo partilhado por qualquer pessoa interessada em contribuir com os temas de seu interesse. A arquitetura de informação "48 Arquitetos de informação geralmente desenvolvem rotinas próprias, muitas vezes baseadas em metodologias já existentes, desenvolvidas por outros arquitetos, para a concepção das estruturas e interfaces dos ambientes digitais. Vemos que essas metodologias se aplicam na concepção dos mais variados ambientes: webs comerciais (B2B, B2C, B2E), portais horizontais e verticais e os portais corporativos. A modulação destes ambientes digitais mostra-se cada vez mais como um campo especializado. A expressão arquitetura de informação foi apresentada pelo arquiteto e desenhista gráfico Richard Saul Wurman, que se destacou por empregar excelentes gráficos nas apresentações das informações. O arquiteto Wurman desenvolveu a seguinte definição: “Arquiteto de informação: a) a pessoa que organiza os padrões que são inerentes aos dados, tornando o conjunto inteligível; b) a pessoa que cria a estrutura ou mapa das informações que permite que outras pessoas achem seus caminhos pessoais até o conhecimento; c) a profissão que surge no século XXI, voltada para as necessidades desta época, e que tem como foco a clareza, a compreensão humana e a ciência da organização da informação.” Na época que Wurman cunhou este conceito lá pelo final da década de 1970, nem se pensava em internet. Os computadores eram gigantes. Não existia o cenário !49 de hoje, onde cada colaborador de uma instituição possui uma estação de trabalho, onde se relaciona com outros colaboradores e com o ambiente externo, sendo um produtor de documentos, informações e conhecimento. Com o advento da internet e das redes de comunicação locais (lans), este cenário aprofunda-se. Nesta nova forma de trabalho surgiram os portais, que precisam ser planejados, programados e abastecidos com informações. Os ambientes digitais são interfaces de relacionamento com pessoas, sendo necessário, portanto, prever todo relacionamento informacional com os seus usuários. Os arquivistas desenvolvem nos seus processos de descrição arquivística, de elaboração de instrumentos de pesquisa e na indexação de arquivos um processo parecido com a arquitetura de informação. Na prática, ao estudar o produtor e o público que acessa os documentos, o arquivista está arquitetando a organização das informações de um arquivo, já que: analisa todas as fontes e os tipos de informação, classifica as que são importantes para o público, define uma estrutura para arranjar os documentos e a forma de apresentação. No caso dos ambientes digitais, os arquivistas podem analisar os públicos que irão acessar os ambientes digitais e organizar as informações de forma lógica. Agrupar as informações por área de interesse, portanto, é muito parecido com a classificação de grupos de documentos nos fundos, criando suas respectivas "50 classes. Assim, organizar informações em um portal pela área de interesse é muito parecido com a criação de uma tabela de arranjo. Alguns itens relevantes da arquitetura de informação A arquitetura da informação projetada de forma eficiente agiliza a conclusão de tarefas executadas pelos usuários na busca do conteúdo. Seu objetivo é que a experiência do usuário (navegação) seja satisfatória e eficiente. Como afirma Jakob Nielsen, a arquitetura da informação deve estruturar o site “para espelhar as tarefas dos usuários e suas visões do espaço de informação”. Um item importante para a arquitetura de informação de ambientes digitais é lembrar que a world wide web é um sistema baseado em navegação por âncoras, onde milhares de hyperlinks guiam os usuários em busca da informação. Essas âncoras (ou zonas de salto) é a função mais básica da internet e um de seus princípios. Configura-se que o acesso às informações não é linear, é interativo. Jakob Nilsen criou a chamada “Lei da Experiência dos Usuários na Web”, onde define regras básicas de funcionalidades vistas com repetição em sites eficientes. Muitas destas funcionalidades e estruturas devem ser levadas em consideração no processo de arquitetura e de organização das informações e desenvolvimento do conteúdo e das interfaces dos portais. !51 Ao planejarmos a arquitetura de informação de um ambiente digital (um portal, por exemplo), definem-se itens como a estrutura informacional, representada nas interfaces e nos grupos informacionais. Essas definições dependem da cultura digital dos usuários, da organização da informação, da tecnologia em que está montada (linguagem, conteúdo dinâmico, banco de dados, html, etc) e o nível de parametrização (customização) dos dados. Fica claro que a arquitetura de informação é a representação digital (um avatar) da estruturação de um serviço de informações orgânicas (arquivos). O arquivista deve conhecer a arquitetura de informação a ponto de saber usar e explorar suas possibilidades. "52 7. A Arquivística e a Arquitetura da Informação: similaridades possíveis A Ciência da Informação, considerada como uma metaciência, abrange várias outras disciplinas, da lingüística à interação humano-computador (IHC) e prevê o intercâmbio com outras áreas que apresentem a informação como objeto de estudo. Logo, por que não pensar as trocas possíveis entre a Arquitetura de Informação (AI) e a Arquivística, pois ambas bebem na fonte da Ciência da Informação e tem um perfil parecido? A arquivística possui um corpo teórico estabelecido e comprovado pela prática - possível fonte para os arquitetos de informação, enquanto a AI apresenta uma teoria multidisciplinar nova que, em função das tecnologias de informação empregadas nos ambientes digitais, utiliza a estruturação da informação orgânica da arquivística. A diferença entre as informações tratadas por arquivistas e arquitetos da informação é quanto a sua utilização. Enquanto na arquivística a preocupação é com a integridade e valor de prova da informação, na arquitetura de informação o foco é a utilização (a eficiência e a eficácia) no uso das informações possíveis e disponíveis no ambiente digital. Podemos identificar a existência de um ponto de convergência básico entre Arquivística e AI, não apenas quanto ao objeto (a informação), mas também quanto !53 às suas finalidades, que é dar acesso a informação. Ambas buscam a organização das informações para futura disponibilização aos usuários, cada uma empregando suas ferramentas. O documento do ponto de vista arquivístico caracterizase pelo registro de informação orgânica, utilizada em tomada de decisão e produzida como resultado das ações de entidades e pessoas. Já nos ambientes digitais, as informações produzidas são registradas para divulgação, promoção, exposição e comunicação com determinado público. Cada área apresenta suas metodologias e seus princípios para o tratamento das informações. Abaixo podemos ver como este relacionamento acontece: Objeto de trabalho: para os arquivistas são as informações orgânicas; para os arquitetos de informação são as informações necessárias em um ambiente, que podem ser orgânicas, de comunicação, noticiosas e assim por diante. Quanto ao objetivo: o arquivista se concentra no acesso às informações orgânicas que representam decisões e registros da vida da instituição que trabalha. O arquiteto de informação busca possibilitar eficiência e eficácia no acesso às informações digitais e a interação do usuário. O arquivista tem, entre suas funções técnicas, criar instrumentos como dossiês e catálogos, que facilitem o acesso às informações. Esta mesma facilidade no acesso à informação é função básica do arquiteto de "54 informação, que deve criar sistemas de navegação e de estruturação web. Quanto à classificação: o arquiteto de informação utiliza-se da taxonomia para criar grupamentos informacionais que categorizam os conteúdos por similaridade e possibilitam acesso direto ou circular a esses conteúdos; o arquivista utiliza-se de métodos consagrados para estruturar as informações, como o método funcional, organizacional, por assuntos, ou mistos. Quanto à avaliação: aplicada pela arquivística através de técnica de classificação e arranjo ou descarte de documentos, a avaliação é a forma de aperfeiçoar espaços e arquivamento de informações nos acervos. O arquiteto de informação nessa hora conta com a ajuda do especialista em gestão do conteúdo para determinar o gerenciamento das informações. Um dos instrumentos utilizados é a Matriz de Conteúdo Crítico, que define a temporalidade e a duração dos conteúdos por sua tipologia dentro dos ambientes digitais. Por último, cito a descrição, outra atividade típica do arquivista, que gera os instrumentos de pesquisa. Ela é a forma de listar as informações, determinando rótulos para cada tipo de informação num acervo. O arquiteto de informação emprega para tanto o tagueamento (rotulagem), que pode ser social ou não. Quando não é, utiliza-se de tesauros. Eis um ponto em comum claro entre as duas áreas: o uso de vocabulário controlado para descrever suas informações, no mundo web através de metadados e no mundo arquivístico através !55 de instrumentos de descrição. E você, já parou para pensar sobre a similaridade entre essas áreas? "56 8. Da descrição ao menu do site: nem todo mundo é arquivista Muito bem, já temos um arquivo permanente, tratado, arranjado e agora quero divulgar. Calma, você precisa pensar muito bem nisso. Um perfil de metadados de um instrumento de pesquisa arquivístico pode servir como elemento de marketing para divulgação de sites de instituições arquivísticas? A descrição passou a ser preocupação da arquivologia há poucas décadas, sendo a última atividade de tratamento técnico, anterior a divulgação de acervos e posterior ao processo de arranjo. Pode-se definir a descrição arquivística como a criação de representações de um determinado acervo, explicitando seu contexto e conteúdo. É atividade que demanda esforço intelectual grande e competências de interpretação de texto, conhecimento histórico, além de habilidade com a língua onde as informações estão escritas. A descrição ganha importância no momento em que traz à tona o conteúdo disponível e as informações registradas no acervo permanente do arquivo que descreve. A descrição utiliza do próprio quadro de arranjo documental, no momento que absorve este como um elemento obrigatório, presente na ISAD(G) norma geral internacional de descrição arquivística, ou da NOBRADE (Norma Brasileira de Descrição). !57 A normatização da descrição é ainda mais recente (década de 2000), e traz para o universo dos arquivos o primeiro esforço de padronização tanto o trabalho do arquivista quanto das informações que estes organizam. O esforço internacional pela normatização através da ISAD(G) foi importante para diferenciar o tratamento técnico de informações orgânicas do tratamento técnico de informações bibliográficas, estas sim passíveis do uso de normas obrigatórias em seu processo descritivo. A diferenciação garante a autonomia do trabalho do arquivista, porém esta autonomia também é um fator de preocupação, visto que é necessária neste processo uma série de definições que precisam de experiência e embasamento técnico. Um processo de mapeamento de instrumentos de comunicação a ser utilizado para divulgar o acervo ajuda a organizar os elementos a serem utilizados na descrição. Se o grande ponto de divulgação será de fato um site, por exemplo, ao se escolher os elementos da descrição que serão utilizados, será determinado um perfil de metadados. Este perfil vai ser utilizado não só na identificação dos elementos descritivos dos instrumentos de pesquisa, mas também pode ser aplicado na descrição dos objetos eletrônicos, no sistema de armazenamento de imagens ou documentos e de recuperação de informações. Os metadados são utilizados no desenho dos ambientes digitais. "58 Um erro básico neste processo de divulgação e construção do ambiente digital é utilizar os elementos descritivos como organizadores da navegação do usuário no site do arquivo. Aqui estamos falando de técnicas de Arquitetura de informação (AI) e devemos pensar nos objetivos macros da AI, que é melhorar a eficiência e a eficácia do usuário no acesso à informação. Sabemos que no ambiente digital, o usuário precisa de um recurso chamado navegação estrutural. Geralmente representada pelo menu principal, esta navegação deve ser enxuta, apresentar o primeiro nível e possibilitar ao usuário saber onde está, para onde vai e onde esteve. Se utilizarmos tão somente os elementos descritores como instrumentos de navegação, este usuário estará em maus lençóis, visto que somente de elementos obrigatórios, a NOBRADE possui 8 ao total. É impossível imaginar um menu estrutural com 8 elementos, todos com seus temas, assuntos e história relacionados. Os elementos descritivos são como os metadados de um site, são estruturais e devem ser orientadores do trabalho do arquivista. É como o diretor de um espetáculo de teatro, que fica atrás das cortinas. Para isso servem os elementos descritivos, agem nos bastidores e fornecem uma melhor visão do contexto e das informações dos acervos. Um bom exemplo disso é o site do Arquivo Digital do Alaska (http://vilda.alaska.edu), onde temos numa primeira tela com somente 4 links de navegação estrutural e a navegação toda se dá, para a boa !59 experiência do usuário, no mecanismo de busca (acesso em agosto de 2010). O elementos descritivos surgem somente após a pesquisa do usuário e são aplicados como perfil de metadados, trazendo as informações de cada imagem do banco de dados. Pense que o usuário que acessa um site não precisa conhecer as técnicas de descrição arquivística e, muito menos, ter opções exaustivas de navegação. Uma boa estrutura de acervo, alinhado com um eficiente mecanismo de busca, garante o acesso do pesquisador ao conteúdo que deseja. "60 9. Foco no usuário: pense no usuário antes dele precisar de você O foco no usuário deve ser pensado antes do usuário precisar de você. Planeje as interfaces, estruturas de informação e a relação do usuário com as informações. A preocupação do foco no usuário é presente na ciência da informação, sendo objeto maior da biblioteconomia e há pouco tempo da arquivologia (que até então focava muito mais na informação). Porém, com o advento da informação digital, eletrônica e em tempo real, tivemos que mirar também as possíveis utilizações da informação pelos usuários. Daí surgiram a ISAD (G) e a NOBRADE que buscam certa padronização e, portanto, uma melhor interoperabilidade entre os sistemas de informações de documentos. Mas isso não é novidade para a arquivologia. Há muito tempo estudo e acompanho a metodologia DIRKS (Designing and Implementing Recordkeeping Systems), elaborada por arquivistas australianos, e que busca criar uma padronização para desenho de sistemas de gerenciamento de arquivos focada nas necessidades de negócio e nos usuários. O segredo é o mapeamento de processos que gera documentação. Aí está um grande diferencial da DIRKS, possibilitar mostrar aos verdadeiros usuários como um sistema pode ser adequado as suas necessidades. Pela metodologia os processos das áreas passam por um levantamento minucioso, junto aos geradores de !61 documentos, de suas necessidades, demandas e formas de trabalhar os documentos. De outro lado, entra a usabilidade das interfaces de relacionamento das informações. Por que um arquivista vai, por exemplo, acompanhar um teste de usabilidade de uma intranet? Um teste de usabilidade de um sistema ou de qualquer interface de relacionamento precisa ser testada por outras pessoas que não foram as que planejaram. Isso é fato. Eu estava convencido de que os colaboradores da empresa onde apliquei o teste achariam com facilidade a biblioteca de documentos do jurídico. Poderiam achar se localizassem fácil a área jurídica. Acontece que, como estratégia de arquitetura de informação, optamos por não criar links com nome de áreas da empresa, mas sim criar uma intranet focada em processos. Decidimos então, depois do teste, criar acessos rápidos a documentos das áreas para mantermos nossa estratégia inicial. E isso não seria constatado sem o teste de usabilidade. Enfim, o foco no usuário é importante já no planejamento. Não pense nela quando o usuário precisar da informação. Pense nela na classificação e arranjo, nos instrumentos de pesquisa, nas interfaces de sistemas de gerenciamento e na relação direta do usuário com a informação. "62 10. Análise heurística como comparação de qualidade Análise heurística como comparação de qualidade: um caso prático mostra o processo de aplicação de heurística de sites de mesma categoria. Sites são serviços de informação? A internet é composta de unidades de acesso a rede, conectada de forma transversal e de múltiplos caminhos. Esse processo acompanha o próprio desenvolvimento da tecnologia. Assim, a conhecida Sociedade da Informação traz à humanidade o paradigma da rede, a multiplicidade de relações, o conteúdo hipertextual e outras características conhecidas. De fato, trata-se do fornecimento de informação, as mais variadas possíveis, através de uma interface. Acessadas nos sites da world wide web, tratando-se, assim, de um serviço de informação customizável pela navegação do usuário. Satisfação do usuário A qualidade dos serviços de informação mede-se através da satisfação dos usuários e pelo padrão de serviço prestado. Esse último, no caso dos ambientes !63 digitais, é que garante a eficiência e a eficácia no acesso às informações. A usabilidade de interfaces informatizadas deve ser estudada em função de sua lógica estrutural e de sua adequação ao contexto de trabalho, às exigências das tarefas e aos usuários. Como avaliar Para conseguir mensurar estas propriedades intrínsecas e extrínsecas, lança-se mão das chamadas avaliações heurísticas. Segundo o Glossário-Net “No mundo virtual, é um lugar cuja porta de entrada é sempre sua home page. Um conjunto de páginas da web que façam parte de um mesmo URL ou endereço. A ideia de site está relacionada à ideia de local, o que na verdade é um paradoxo em se tratando de um espaço virtual criado por uma rede distribuída que lida com hiperdocumentos.” Avaliação heurística Heurísticas são regras de análise e parâmetros eficientes que são usadas para fazer avaliações. São baseadas nas melhores práticas e experiências dos usuários frente aos ambientes virtuais. As heurísticas são baseadas em princípios de comportamento da informação, da interação humano-computador, da navegabilidade, ergonomia cognitiva e Gestalt, que extrai das atividades de uso e da pesquisa dos ambientes virtuais uma avaliação. Uma das mais conhecidas no Brasil é a Avaliação de DIAS com 109 questões, distribuídas em 7 heurísticas. "64 Estas questões podem ser consideradas suficientes para mostrar a eficiência e a eficácia dos sites avaliados. · A heurística 1 trata da forma como o portal se relaciona com o usuário; · A heurística 2 analisa as características que possam implicar em perda ou ganho de qualidade da leitura e da compreensão do conteúdo do portal. Legibilidade, estética e densidade das informações; · A heurística 3 trata do controle do usuário ao transitar pelo portal. O sistema não deve se comportar de forma inesperada ou requisitando uma quantidade demasiada de entrada de dados; · A heurística 4 relaciona-se à adaptação do portal de acordo com as características de cada usuário; · A heurística 5 trata dos mecanismos que visam diminuir, evitar ou corrigir a ocorrência de erros; · A heurística 6 refere-se à coerência e homogeneidade e coerência na apresentação das variadas opções apresentadas pelo portal. A padronização dos formatos, das localizações e sintaxe faz o portal menos sujeito a imprevisões por parte do usuário; · A heurística 7 analisa a compatibilidade entre as características do portal e as características psicológicas, culturais e técnicas do usuário. !65 A heurística é uma forma eficiente de avaliar interfaces digitais. A Heurística da Dias você encontra em http:// www.geocities.com/claudiaad/heuristicas_web.html "66 11.Como a interação toma conta do digital O mundo virtual está cada vez mais como o real. Surgem sempre novas formas de interatividade que utilizam novos tipos de interfaces, vitaminam antigas e potencializam a representação do mundo real no mundo virtual. Com o advento das redes sociais, as pessoas conseguiram ser representadas no mundo virtual. Mesmo aqueles que nunca pensaram em suas personas virtuais criaram seus sites, avatares ou ambientes que registram suas informações. São representações do real, porém, são virtuais. Assim, o Orkut, por exemplo, mostra que as pessoas têm seu reflexo na rede, disponível vinte e quatro horas por dia. Apesar disso, ainda não se deram conta que qualquer intervenção sua no mundo digital representa uma expressão dessas personas virtuais no mundo virtual. Se antes o virtual tentava representar o real em toda sua forma, como era o Geocities no começo da internet, onde cada cidade representava um tema, hoje vemos que a personalização, a relação humano-computador é que dá a tônica desse relacionamento. Hoje a taxonomia mudou, temos a folcsonomia. Não existe interface única, mas sim interface personalizável, onde o usuário arrasta a caixinha que considera mais importante, configura a previsão de tempo para a cidade que quiser, escolhe a cor da barra superior, etc. !67 Não quero usar fazer exercícios de futurologia para argumentar o que estou pensando, mas vendo os novos ambientes digitais e as novas interfaces que fazem sucesso na web 2.0, vislumbro um novo momento para a arquitetura de informação e para a disponibilização de informação ao usuário. Primeiro: podemos constatar que a participação do usuário é cada vez mais requerida. Só para resumir: falo da Wikipedia, do YouTube, do Del.icio.us (sites com alta participação dos usuários). Em todos estes ambientes o usuário é convidado a criar tags (termos), desenvolver conteúdo e participar. E realmente ocorre tal participação, como se cada um pegasse para si a responsabilidade de gerir e manter esses ambientes. Segundo: podemos ver que as interfaces cada vez mais representam o mundo real no virtual. E não falo do ludismo de certas interfaces, que é com certeza o caminho mais plausível. Falo da interatividade e da facilidade intuitiva do uso destas interfaces. Neste caminho está o SecondLife e o Habbo Hotel (mundos virtuais da www). O próprio Google Earth traz a representação real do mundo físico no virtual, usando a geolocalizacão. Nele, com sorte, podemos ver na rede a foto do telhado da nossa casa. Estamos, portanto, falando de interfaces mais humanas ou representações pixeladas da realidade, que não são resultado de estudos científicos da experiência do usuário na rede, no uso da interface gráfica em html, mas sim uma representação mais próxima possível do real. É o caso da realidade aumentada (integração do "68 mundo real e elementos virtuais ou dados criados pelo computador). Voltamos à noção de cidades na rede como era no princípio no Geocities, porém, agora o objetivo é tornar fácil o uso, apelando para a vivência do usuário e não para a experiência. Podemos projetar o conceito de ambientes relacionais, onde as comunidades humanas se relacionam com um ambiente e onde o usuário se relaciona com outros. Apesar dessa tendência, ainda temos limitações. Acredito que temos de esperar uma evolução da tecnologia. A relação ocorre em três dimensões, porém, ainda não temos outros sentidos que completam a vivência do usuário com o mundo. O caminho está sendo este, porém, é necessário adaptações. Os ambientes relacionais serão o futuro e a participação do usuário da informação já é realidade. Porém, ainda devemos pensar naquele bom e belo ambiente digital bem planejado, aplicando na sua estratégia a usabilidade, buscando tirar o melhor nas leis da experiência do usuário e pensando que um dia o que valerá serão as leis da vivência do usuário. !69 12. A nuvem da internet está na cabeça do arquivista 2.0 As alterações da tecnologia da informação trazem novos desafios para o arquivista 2.0, que agora deve ter a cabeça “na nuvem” e saber que um novo tipo de armazenagem de documentos está surgindo. O esquema da Parte II do e-Arq BRASIL – Versão 1 (Modelo de Requisitos para Sistemas Informatizados de Gestão Arquivística de Documentos do CONARQ Conselho Nacional de Arquivos), estabelece um conjunto de 79 elementos essenciais de metadados, destinados a: · Identificação do documento; · Gerenciamento do seu ciclo de vida; · Organização em um plano de classificação associado a uma tabela de temporalidade e destinação; · Identificação dos agentes envolvidos nas ações de gestão de documentos e informações referentes ao objeto digital para administrar ações de preservação. Ou seja, este é um esquema a ser utilizado pelos arquivistas brasileiros para desenhar novos sistemas, avaliar e escolher softwares que gerenciem documentos digitais. Estudei o esquema com olhos de quem estudou bastante a criação de perfis de metadados na "70 graduação e até hoje utiliza tal recurso no mundo dos portais corporativos. Este esquema pode ser importante por estabelecer um perfil único. Ou seja, vamos ao caminho da padronização, coisa possível internacionalmente com o uso do Dublin Core (DC). Mas o DC, com seus 15 elementos atingem os metadados principais, enquanto que este esquema do CONARQ é mais abrangente e mais arquivístico em seus elementos essenciais. Especificamente sobre o esquema proposto pelo CONARQ faço duas observações importantes: (1) A tendência da tecnologia da informação é o aumento do uso dos chamados softwares que estão na “nuvem” da internet. Ou seja, em breve os documentos estarão soltos pela internet e não possuirão uma localização física num servidor exclusivo. Dúvida? Uso há muito o Google Docs, que é um servidor do Google, mas na verdade pouco importa, não sei onde fica este servidor, está na nuvem. Como o arquivista 2.0 se preocupa com isso? Tenho uma URL e esta é a única forma de localizar aquele documento. (2) Os metadados podem também indicar se o software é open source ou não. Qual a importância disso? Se tivermos este metadado, saberemos como tratar este item em relação à preservação digital. Você sabe que softwares proprietários podem representar o fim da legibilidade de um documento se a empresa que fabrica este software falir, não? !71 Esses dois itens são pertinentes, focados em tendências da tecnologia e são importantes para o tratamento que o arquivista 2.0 vai dar ao seu acervo digital. CDs, servidores e formas de armazenagem estão alterando de forma considerável e a nuvem da internet está em nossa cabeça. E você, já pensou no esquema de metadados de seus arquivos digitais? Sabe que esta é uma missão do arquivista 2.0? "72 III. O Arquivista 2.0 e a Gestão do Conhecimento Conhecimento é gerado com informação e conteúdo, disponíveis nos ambientes digitais onde o arquivista deve enveredar para poder entendê-la e estruturá-la. Acredito que a Gestão do Conhecimento (GC) seja a forma mais adequada de organizar a informação humana digital. Coloco neste espectro a taxonomia e a folcsonomia que de fato estruturam a representação temática deste conhecimento. Neste capítulo, procuro mostrar como o arquivista poder medir a GC para valorizá-la como um investimento, apresento algumas aplicações práticas e ainda a forma de estruturar o conhecimento e arquiteturar a participação. !73 13. GC: acompanhando os resultados A mensuração do investimento em Gestão do Conhecimento (GC) – uma das maiores fontes de preocupação de sobrevivência de programas de GC nas empresas – é um importante ponto de atenção no momento de propor um programa de GC. Um dos maiores erros que pode ter um programa de GC, que embora pareça absorver vários tipos de abordagens teóricas e práticas, é não levar em consideração o valor estratégico e de negócios. Muitas vezes considera-se GC como a acumulação de recursos pela mineração de experiências e pelo acesso de informações de outras empresas. Não conseguindo ver seu retorno em inovação ou novo produto. Foca-se em aplicações pontuais e não em políticas corporativas. A mensuração do resultado do investimento em GC é assunto diário no meio corporativo e de consultorias especializadas. Muitas vezes resolvida com a aplicação de métricas de evolução, geralmente focadas nos resultados dos programas e nos componentes de GC, mas dificilmente se mensura resultados de retorno ao negócio. Este é a métrica mais difícil, mas não impossível. Li um estudo que destaca que, no tocante aos impactos na GC, os resultados financeiros e não financeiros são construtos diferentes, ou seja, se houver mudanças nas "74 práticas de GC, elas não necessariamente afetarão o desempenho financeiro. GC envolve gestão de pessoas, sistemas, processos e valores intrínsecos de personalidade e caráter. Administrar um programa destes pressupõe a prática constante e ininterrupta dos conhecidos quatro pilares do conhecimento: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver com os outros e aprender a ser. Aos profissionais da informação, como os arquivistas, que atuam ou tentam implementar programas de GC em empresas, cabe o papel de entender seus componentes, buscando a valorização dessa gestão e respostas para questões de como mensurar o retorno para a empresa do investimento realizado em gestão do conhecimento e informação, gerando números e resultados para sua instituição. Baseado em melhores práticas internacionais e aplicados junto a projetos e programas de gestão do conhecimento, podemos buscar mensurar: • Quantidade de grupos de discussão sobre inovação de processos ou produtos; • Quantidade de contribuições válidas para a memória organizacional / intranet; • Quantidade de mensagens ou documentos armazenados no sistema; • Número de usuários cadastrados que utilizam o sistema; !75 • Qualidade do conhecimento armazenado; • Avaliação de experts para verificar a qualidade; • Quantidade de edições ou atualizações feitas; • Grau de atualização do conhecimento; • Feedback dos usuários; • Quantidade de comunidades de prática ativas; • Estatísticas de uso da memória organizacional / intranet; • Percepção dos colaboradores em relação aos meios de comunicação interna disponíveis (levantado através de pesquisas qualitativas); • Quantidade de sugestões úteis incorporadas aos processos produtivos e/ou produtos; • Estatísticas de utilização do sistema; • Estatísticas de utilização dos mecanismos de busca; • Número de ideias ou patentes gerados após implementação do programa de GC; • Comparação entre quantidade de horas planejadas para as atividades de mensuração e a quantidade de horas utilizadas. "76 14. Inovação sem blábláblá Muito se fala em inovação. O importante é tirar do campo das ideias e trazer para a realidade, definindo de forma clara, objetiva e rápida o que é inovação, a importância dela para a sociedade e para o mundo corporativo. Inovar como? Pessoas com ideias e objetivos comuns. Na história da humanidade este sempre foi o ponto de partida para a inovação. Agora pense no século XXI, quando elevamos a uma infinita potência esta reunião entre pessoas, proporcionada pela internet, e o resultado é a potencialização de quantas ideias podem ser geradas quando centenas de pessoas debatem sobre determinado assunto. Este brainstorm, assíncrono, disponível para os momentos de epifania, é o ideal a ser reproduzido quando as empresas procuram inovação, ao permitirem que funcionários, parceiros e clientes exponham suas sensações, ideias, necessidades, críticas e sugestões sobre seus produtos e serviços. Dois pesos, duas medidas !77 As redes sociais estão mostrando que esta abertura, que busca inovação, ideias, produtos e novidades pode ser algo positivo e negativo ao mesmo tempo. O ano de 2010 está sendo pródigo em mostrar que a “opinião pública” é sagaz em gerar ideias, mas também em criticar sempre que for ludibriada. Vários casos de promoções em redes sociais, envolvendo grandes empresas (multinacionais, inclusive), acabaram por gerar virais (forma de propagação de movimentos nas redes sociais) que não atendem às expectativas e mostram a disponibilidade dos usuários em participar e também em criticar. E este espírito alimenta a inovação e precisa ser entendido. Hoje está claro que a inovação depende muito mais da interação das empresas com as pessoas em ambientes colaborativos e nas redes sociais, do que dependia antigamente dos cientistas das áreas de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), em seus laboratórios caros e que por anos pesquisam novas soluções até encontrar o produto, serviço ou processo ideal. O mercado é tão dinâmico que já não espera mais a perfeição dos cientistas. E os consumidores já não aceitam a impossibilidade de interferir naquilo que estão adquirindo. A colaboração como teia da inovação A tecnologia da informação, as redes sociais, as comunidades e ambientes colaborativos são hoje as arenas onde a inovação é mais oxigenada. Mas o desafio para as áreas de inovações e para as empresas "78 e instituições vai além de simplesmente escolher e programar as ferramentas mais adequadas para a troca de informações. Já é de conhecimento público que a ferramenta não é nada sem as pessoas e precisamos considerar esta dimensão no processo de inovação. É das sinapses humanas que nascem as ideias. E é isso que precisa ser considerado em qualquer ambiente colaborativo. Ou seja, temos a clareza que a colaboração é um processo humano, cujo fim é a relação entre as pessoas e o meio é a tecnologia e os ambientes sociais. A colaboração é, por assim dizer, a base para a inovação. Porque as pessoas colaboram? Por motivos diretos, a participação se dá através da curiosidade quanto ao objetivo da comunidade, por uma necessidade de realização e de reconhecimento e até por altruísmo (diferente do egoísmo). A colaboração se dá também por recompensas diretas (este é um grande diferencial no planejamento neste tipo de ambiente), reconhecimento (imagine ter uma ideia sua aceita por todos) e reciprocidade (se este ambiente me aceita, posso conseguir coisas dele também). De nosso lado, ao planejarmos um ambiente colaborativo devemos considerar fatores importantes como o tempo disponível para participação, a usabilidade do ambiente, simplicidade (foco na solução) !79 e transparência (do ponto de vista da governança e da participação). Por isso, sempre pensamos em ambiente assíncronos, pois as pessoas colaboram na medida em que podem realizar tal atividade. Metodologia Arquitetura de Colaboração Trabalho com a metodologia Arquitetura de Colaboração, que considera todos os fatores humanos e tecnológicos. Mas também sabemos que o mundo dos negócios precisa de resultados para garantir a continuidade destes ambientes e de seu negócio. Por isso consideramos sempre a orientação estratégica (alinhamento do planejamento do ambiente com as necessidades de negócio) e os objetivos traçados. Vamos buscar de fato a colaboração para melhorias dos processos e dos produtos, para aumentar a participação e a inovação? Definir métricas passa a ser a forma de mensurar a maturidade destes ambientes, acompanhar sua evolução e decidir a hora de ampliar, migrar ou até criar novas comunidades e ambientes de colaboração. A inovação é resultado da interação e colaboração humanas e está na hora de proporcionarmos cada vez mais este tipo de interação, seja em ambientes digitais, seja em nossa vida. Esta onda já toma as redes sociais e cada vez mais o mundo corporativo entende que é hora de proporcionar a colaboração entre seus funcionários. "80 15. Taxonomia: simples assim. Muito se fala em taxonomia e neste texto podemos ver sua aplicação na prática das corporações. Uma visão simples da taxonomia no universo da informação. A taxonomia soa com algo restrito, uma atividade intelectual extrema, capaz de despertar interesse apenas em cientistas ou bibliotecários. Embora só recentemente tenha ganho importância no mundo corporativo, a disciplina da taxonomia não é nova. Ela sempre esteve presente no universo científico. O exemplo clássico é a classificação dos seres vivos, do ano de 1735, trabalho do botânico sueco Karl von Leneé (Taxonomia de Lineu). Em sua taxonomia, o cientista dividiu os seres vivos em grupos, de acordo com suas características em comum, obedecendo a uma ordem hierárquica. Era assim: Domínio · Reino · Filo · Divisão · Classe · Ordem · Família · Gênero · Espécie · Subespécie. Dá para imaginar que a taxonomia é um conceito importado da Biologia pela área da informação para designar o conjunto de termos estruturados hierarquicamente, representativo das áreas de atuação de uma empresa ou corporação. Diversos fatores no final dos anos 90 deram origem a um interesse em taxonomia: a) Sobrecarga de informação: os mecanismos de busca convencionais são vistos, com frequência, como inadequados para lidar efetivamente com bases de !81 dados muito grandes, e os usuários necessitam de ajuda de busca e filtros complementares. b) Labirintos em busca por informação. Pesquisas tem mostrado que a maioria dos usuários finais tem problemas para saber como buscar informação nas interfaces digitais. c) Existência de terminologias organizacionais: classificações, vocabulários controlados e tesauros publicados não refletem as linguagens próprias das organizações. Cada organização possui sua cultura e esta é que deve estar representada em linguagem terminológicas. d) Desestruturação das organizações: grupos diferentes de usuários começam a compartilhar informação e conhecimento dentro de contextos organizacionais. e) A informação está dispersa em diversas bases de dados por toda a empresa. Ninguém sabe o que existe ou onde está a informação e não existe um ponto unificado de acesso à informação. Problemas informacionais ocorrem todos os dias em empresas e instituições que dependem que uma boa informação seja entregue a tempos para as pessoas que dela necessitam. Existem vários tipos de problemas. Alguns são causados pela informação errada, informação desatualizada, falta de informação ou informação incompleta, e também pela grande quantidade de informação. "82 Com o advento da internet e das redes internas representadas pela intranets, cada trabalhador se transformou em um consumidor de informações, mas sem nenhum treinamento em pesquisa ou mapa do que está procurando. Sem treinamento e habilidades em informação, a maioria das pessoas não sabe por onde começar uma busca, como pesquisar, o que procurar ou quando é melhor parar de procurar (nos casos de interfaces com usabilidade deficiente esta condição se multiplica). Um dado pode se parecer muito com outro e, se o usuário não compreender o que é uma informação válida, pode haver muita confusão quanto a isso. Muitos profissionais estão sobrecarregados de informação e têm poucas ferramentas para ajudá-los a lidar com isso. São bombardeados por e-mails, cópias de apresentação, alertas de novos artigos interessantes, relatórios, reuniões, e todos os meios que acompanham quem trabalha com conhecimento. Gastam horas tentando recuperar algo que viu ou leu, mas que parece ter sumido. Tentam alcançar colegas que podem ter as peças que faltam do quebra-cabeça, seus computadores com anotações de uma reunião. Problemas de acesso às informações são causados não somente por falta dela, antes pelo contrário, mas principalmente por não conectar a informação certa à pessoa certa na hora que precisa. As pessoas usam informação dentro do contexto do que fazem no momento. Precisam ter acesso à informação correta, mas somente quando dela necessitam. E !83 precisam ter certeza de que o acesso seja garantido, fácil, rápido e confiável. Uma busca deve trazer toda a informação de uma empresa, sem importar onde ela esteja e em que formato se encontra. A taxonomia é um sistema que classifica e facilita o acesso à informação. Permite alocar, recuperar e comunicar informações dentro de um sistema, de forma lógica. A classificação hierárquica pode auxiliar os usuários a entender como o conhecimento explícito pode ser agrupado e categorizado. Ela serve, além de facilitar a navegação em interfaces, para indexar conteúdos e estruturar bases de documentos. A taxonomia representa conceitos, agiliza a comunicação entre produtores e públicos (interno/ externo) da informação, controla a diversidade de expressão do conhecimento, oferece um mapa de navegação e serve como guia em processos de conhecimento. A taxonomia uniformiza a classificação do conhecimento e das informações, facilitando o compartilhamento desses ativos entre as pessoas e áreas que geram e consomem conhecimento. A taxonomia em meio a grande massa de conhecimento, informações e produtos, esclarece os conceitos em uso, ao invés de criar novos termos para o mesmo fim. Introduz ordem, elimina ambiguidades e classifica a informação de maneira lógica. Coloque a taxonomia no seu dia a dia. "84 16. A organização da informação enquanto tendências: folcsonomias A folcsonomia pode ter várias definições. A maioria delas refere-se à atividade de etiquetar, no entanto, outros destacam a questão "social/coletiva". São metadados atribuídos por uma inteligência coletiva; é aqui que reside o seu diferencial e o maior desafio dos profissionais da informação: incorporar essa novidade e saber como tratá-la. O impacto da folcsonomia nos metadados é que cria esse paradigma e origina uma abordagem de organização dos recursos da web, ou como dizem uma etnoclassificação, isto é, a classificação popular. Mas esse é só um campo de metadado. O Dublin Core, por exemplo, um padrão de metadados proposto internacionalmente e que é base do projeto de implementação da web semântica, possui 15 campos mínimos de estruturação de informação. Podemos ver que por trás da participação do usuário, há a necessidade do tratamento técnico do objeto informacional e mesmo dessa classificação aplicada pelos usuários. Podemos notar que o papel do profissional da informação vai além do que aceitar as classificações populares. É um papel também de organizador dessa classificação. Essa tendência também merece um aprofundamento de estudo. Alguns caminhos para esse aprofundamento são os seguintes: !85 • A etiquetação e a classificação: semelhanças e diferenças; • A relação da etiqueta individual com a classificação técnica; • A revocação por palavras em sistemas de buscas digitais; • A individualização da informação versus a massificação de informação na web; • A relação da ciência da informação com a etiquetagem através da folcsonomia. Podemos concluir que essa tendência é um campo que demanda estudos aprofundados, relaciona-se diretamente com a experiência do usuário com a navegação web e, desde já, pode ser um desafio para a ciência da informação. Vimos que a organização da informação é um desafio diário da ciência da informação, que precisa cada vez mais posicionar-se como elemento de agregação num mundo contemporâneo que conta com a explosão informacional como seu desafio. A organização da informação é possível em escopos determinados e utiliza recursos como linguagens documentárias, indexação, classificação e demais atividades de um tratamento técnico. Surgem tendências sobre organização da informação que acompanham novas tecnologias de registro e recuperação da informação. E mesmo essas tendências "86 necessitam de um aprofundamento científico a fim de determinar sua real utilização e importância para os profissionais da informação. !87 17. Folcsonomia: da salada de frutas à estruturação da informação A web 2.0 chega e altera substancialmente a forma como são tratadas as informações orgânicas nos ambientes digitais. Antes tínhamos uma instituição que gerava informações como resultado de suas atividades, agora temos usuários que geram informações orgânicas através de sua participação. Analiticamente, estamos falando de informações orgânicas que geram um perfil (ou vários) das pessoas que ali participam de um mesmo ambiente. A folcsonomia facilita a construção de um mapa dos desejos dos usuários e de seu universo semântico. Ao analisar uma nuvem de tags, por exemplo, teremos uma lista das palavras mais buscadas pelos usuários. Isto não acrescenta qualidade ao conteúdo, mas representa desejos e informações buscadas e metadados aplicados por uma média de usuários. Como metadado, no entanto, é preciso tratá-lo e contextualizá-lo num processo de descrição de um recurso digital. Sem isso, o processo de tagueamento pode ser um desastre. Por outro lado, se bem administrado ele pode ser um caminho para a web semântica, possibilitando inferências variadas com respostas mais efetivas. Logo, a folcsonomia pode ser vista como um novo paradigma de classificação, que respeita diferenças culturais, semânticas e pessoais de quem utilizou e classificou determinada informação. Ela possibilita que os usuários da informação atribuam os "88 termos para a indexação colaborativa dos conteúdos como eles os veem. Prefiro conceituar a folcsonomia como uma taxonomia dinâmica, social e temporal ao mesmo tempo. Ela representa, através dos termos propostos, representação dos perfis diferenciados de usuários que surgem do cruzamento analítico desses termos. Acredito que a folcsonomia é a vivência do usuário representado na classificação, criando um campo de metadado a ser aplicado na taxonomia. E isso mostra que a experiência do usuário ainda é importante para o planejamento, implantação e manutenção de ambientes digitais e para as informações que ali são dispostas. Uma das vantagens que podemos destacar no uso de folcsonomias, a mais importante talvez, é o cunho colaborativo e social desta classificação. Assim, no processo técnico descritivo (de indexação), com certeza o peso dessa folcsonomia será mais um elemento, que deve ser combinado com um vocabulário controlado. Para a web 2.0 é um outro recurso, pois pode-se formar com facilidade comunidades em torno de assuntos de interesse na medida em que, ao utilizar funcionalidades de folcsonomia, o participante do ambiente digital tem acesso aos outros participantes que possuem os mesmos interesses identificados através das tags. Sabe-se que a leitura tanto textual quanto de imagens é diferente de pessoa para pessoa e depende de vários fatores como formação intelectual e cultural. No caso !89 da folcsonomia, estas diferenças são respeitadas já que não há regras para expressão das tags ao etiquetar determinado recurso. Logo, um mesmo termo pode ter significados diversos para os vários usuários que atribuíram as etiquetas. Um termo comum como “design” é atribuído para bilhões de recursos diferentes, tornando impossível, assim, uma consulta produtiva sem refinamento adicional. Logo, isso é exatamente o contrário de vocabulário controlado, é um vocabulário aberto, social, participativo. Mas volto a destacar, este não é o metadado-chave. A folcsonomia é particular, porém colaborativamente dá uma ideia do perfil médio dos usuários da informação. Mas por não ter uma normatização pode causar incongruência no processo de busca e recuperação da informação. É pessoal e pode ser partilhado, mas não é semanticamente representativo se não for analisado em conjunto com outros termos e, caso isso não aconteça, não é tecnicamente plausível. Por isso, não pode ser único. Se o seu portal busca a web 2.0 e você utiliza somente o tagueamento social (folcsonomia) poderão ocorrer problemas comuns em processos de classificação como polissemia, sinonímia e variação de nível básico. Logo você terá uma salada de frutas para administrar. A principal vantagem apontada pela literatura é o cunho colaborativo das folcsonomias, e a desvantagem está justamente na falta de controle de vocabulários que é resultado de outra característica destes sistemas – a "90 liberdade de indexação dos conteúdos conforme as necessidades e entendimento do próprio usuário. Neste contexto, o grande desafio é desenvolver aplicações que mantenham o cunho colaborativo ou social da folcsonomia, mas que consigam atingir maior qualidade na indexação. Dessa forma, acredito que o sistema de classificação dos portais deve cruzar taxonomia com a folcsonomia, o que acarreta a organização pessoal da informação. E não é o caso de democratismo, tão avaliado quando falamos de um portal corporativo. A sugestão é de que a folcsonomia seja utilizada como insumo para a construção da taxonomia. Assim, numa estrutura de governança e classificação da informação é necessária uma instância mediadora, transparente para o usuário (governança/responsáveis pelas informações digitais/conteudistas) que possa servir-se das qualidades emergentes da folcsonomia e atuar como revisora/editora deste caldo emergente. Sempre olhando diretrizes estratégicas que também são dinâmicas, fazendo com que este sistema emergente agregue valor para o ambiente digital da empresa. Abra espaço para a participação dos usuários e use a web 2.0 para aumentar a colaboração no portal que você administra. No entanto, não caia na armadilha de pensar que isso vai solucionar problemas de indexação, descrição, recuperação e organização das informações de seu ambiente digital. O risco é que tudo se torne uma salada de frutas, com pedacinhos para todos os !91 gostos. A web semântica só é possível com a estruturação da informação – aplicando peso semântico através de metadados. Assim, vamos antes aprender a usar a web 2.0 e a colaboração para depois pensar na web 3.0. O termo web 3.0 tem sido utilizado de uma forma comum para representar a web semântica, este sim um termo significativo para representar o futuro da estruturação da informação na rede. "92 18. Memória Corporativa traz ganhos às empresas A memória empresarial é um luxo ou investimento na gestão do conhecimento e preservação da história na prática? O projeto de memória corporativa é estratégico e deve considerar as técnicas desenvolvidas e aprimoradas para este fim nos últimos anos na área da ciência da informação (aqui incluo digitalização, indexação e tratamento da informação). O processo de preservação da memória não se restringe a coletar fotos antigas e papéis envelhecidos, até sem valor administrativo. O resultado da elaboração da memória empresarial deve ser um conteúdo que terá o tratamento adequado a um de seus maiores patrimônios – a história – e que poderá ser usado para o futuro da organização. Muito consideram o processo de desenvolvimento de um projeto de memória corporativa como um esforço de comunicação corporativa. De fato é um projeto com retorno em longo prazo e investimento inicial elevado, mas o processo de sistematização da memória empresarial é um dos melhores instrumentos à disposição da comunicação institucional. É neste momento que as pessoas redescobrem valores e experiências quanto à marca, reforçam vínculos presentes, criam empatia com a trajetória da organização e podem refletir sobre as expectativas dos planos futuros, atendendo assim a um dos requisitos básicos da ciência da história e da vida em sociedade. !93 Um projeto de memória empresarial pode proporcionar um excelente momento para construir a identidade coletiva. Nesta hora é que se vê o poder de comunicação de uma marca e a presença dela nas comunidades e nas cabeças das pessoas. Em datas comemorativas de peso (50 anos de atuação, 75 anos de fundação, etc) é quando se aproveita para a formação de um sentimento coletivo de posse e de orgulho da empresa nas comunidades. Porém, cabe destacar que projetos de memória não é apenas esforço de marketing e de comunicação, mas que ele realmente tem seu papel de resgate, organização e interpretação da história da instituição e de seu papel para o desenvolvimento do país, podemos assim defini-lo como um projeto multidisciplinar de gestão do conhecimento. Os arquivistas têm um papel muito interessante. Antes de gerar produtos e ter resultados como exposições e publicações, há um importante trabalho estruturante de organização dessas informações orgânicas. Muitas delas informações únicas, resultado das próprias atividades desenvolvidas pelas corporações. Este trabalho passa por estruturar a classificação do acervo, o próprio processo de avaliação e descarte, a temporalidade, o arranjo documental e, ainda, relativo às novas tecnologias como indexação, digitalização e disponibilização das informações, presentes num ECM (Entreprise Content Management). Antes de qualquer esforço em organizar alguma exposição que torne pública partes da história das "94 instituições, estas devem passar pelo processo de tratamento técnico, nos passos listados acima e que são naturais às atividades dos arquivistas e profissionais da informação. Lembrando que isso é um elemento de responsabilidade de um estruturado Centro de Documentação e Memória, que por si só é o mais completo produto da memória empresarial e dá suporte a todos os demais produtos e serviços daí decorrentes. Por isso, no organograma de uma empresa, deve ser considerado como um prestador de serviços que dá suporte às demais áreas da empresa. Lição de casa feita, tudo estruturado, organizado e sob guarda permanente, agora é possível criar produtos destes serviços de informação. Os mais comuns são: · Livro e Álbum – O livro histórico-institucional ou álbum deve ser uma publicação de boa qualidade, ilustrada, contemplando os mais importantes marcos da história da organização, e suas relações com o contexto social mais amplo, com veracidade e conteúdo. · Sites web e intranets – No ambiente digital, todas as informações relevantes que descrevem a trajetória da empresa ficam organizadas, permanentemente atualizadas e acessíveis a todos os públicos: colaboradores, stakeholders, clientes, governo, instituições e sociedade em geral. · Memória oral – A memória oral tem como foco a coleta e o tratamento de depoimentos que visa a !95 preservação do conhecimento que está na cabeça e na experiência das pessoas. · Dossiês internos – Informações estruturadas podem ter o objetivo de orientar os gestores sobre aspectos da evolução da empresa. Podem trazer inclusive informações confidenciais. · Museu empresarial e exposições – Montados em datas especiais, são produtos que promovem interface com os públicos interno e externo, especialmente com os formadores de opinião. É importante destacar que os centros de memória (vinculados aos centros de documentação) são as áreas responsáveis pela aplicação de uma política sistemática de resgate, avaliação, tratamento técnico e divulgação de acervos e, principalmente, pelos serviços de disseminação do conhecimento acumulado pela instituição. Resumindo, é arquivologia e gestão do conhecimento na prática. Estes centros de memória precisam contar com um espaço físico, infraestrutura e recursos humanos para garantir não somente sua permanente atualização, como também o apoio que dá a toda a empresa. Quando a Memória Empresarial passa a fazer parte do organograma da empresa, esta empresa passa a ter um diferencial em relação aos concorrentes, já que se torna mais visível e sólida. Além disso, ela torna disponível e com agilidade, as informações pontuais e retrospectivas necessárias à gestão dos negócios. "96 !97 IV. Arquivistas nos portais Trabalho com portais corporativos há um bom tempo. É com a construção deles que criei a visão do arquivista 2.0. Com a geração destes ambientes, questionei não só conceitos que um dia podem ficar ultrapassados, mas olhei para frente e vi como o arquivista pode se envolver na criação destas interfaces. Neste capítulo derradeiro, falo do papel do arquivista nos portais corporativos e vejo que o papel deste profissional vai além da forma, envolve o resultado da interação entre as pessoas, a chamada inteligência coletiva. "98 19. A emergência da colaboração e a construção de portais corporativos Um dos fatores de gestão do conhecimento que contribuem para sua expansão é o incentivo a colaboração, responsável pelo registro de inovação, do conhecimento tácito e pela circulação de informações nos ambientes empresariais ou estatais. E a colaboração se dá através de ambientes digitais que possibilitam a participação, como os portais de internet. A Arquitetura da Participação (AP) define os requisitos dos ambientes digitais e as necessidades institucionais que impactam na elaboração dos ambientes colaborativos, sejam eles a governança, arquitetura de informação, plataforma tecnológica e a estruturação da informação (taxonomia e metadados). A AP é a forma de planejar a colaboração no portal corporativo, transformando a emergência da participação em um ativo de negócio, é uma vertente da arquitetura de informação, um instrumento de planejamento de ambientes digitais que se utiliza de várias ferramentas consagradas para criar o conceito e a estrutura desses ambientes. !99 A AP engloba resultados organizacionais, a cultura das empresas e gestão de mudanças. Seu domínio é mais estratégico do que arquitetura de informação para sites web, que foca mais em decisões táticas sobre navegação e experiência do usuário. A AP é uma área nascente, e estamos ainda começando a mapear e desenvolver linguagens para descrever seus conceitos básicos e desafios. No campo especializado a AP usa técnicas, ferramentas e metodologias que vêm sendo desenvolvidas, geralmente adaptadas daquelas criadas para a arquitetura de informação. "100 20. O papel do arquivista, profissional da informação, nos portais corporativos Os arquivistas tem seu papel cada vez mais destacado no mundo dos portais corporativos. O contexto O aumento do acesso à tecnologia digital joga as organizações e instituições diretamente no mundo dos computadores e sistemas de informação; e cada vez é maior o número de empresas e instituições que utilizam os portais corporativos como instrumento de gestão documental e de informações. Os portais corporativos acessados na rede interna (intranet) ou remotamente por outro tipo de conexão segura e criptografada são meios de trocas documentais e geram centenas de novos arquivos a cada hora. Além de gerarem informações sobre a gestão da empresa (o papel de registrar ações e transações), estes também geram arquivos das comunicações entre os colaboradores, de circulares, !101 notícias selecionadas e instrumentos de relacionamentos. Sem falar naqueles conteúdos classificados como institucionais, além dos educacionais. Fica cada vez mais claro que o profissional da informação deve exercer seu papel na defesa de registros que realmente interessam como prova e registro de ações das administrações. Os arquivos digitais acumulam-se e representam o próprio dia a dia da administração. Mesmo assim, nos espaços digitais, temos que otimizar o armazenamento e acesso a estes arquivos. O enredo Muitas vezes, por falta de planejamento dos bancos de dados e dos sistemas informacionais que estão nos portais e que administram as trocas de informações ou, ainda, pela simples falta de previsão e projeção de um futuro próximo, estes arquivos acabam parados em listas indexadas somente por ordem cronológica, desconhecendo-se tabela de temporalidade, de classificação ou ainda avaliação e descarte. Milhares de páginas comerciais, educacionais, doutrinárias, blogs e suas vertentes além de páginas pessoais fazem as pessoas perderem muito tempo para escolher ou pesquisar a informação que procura. Mesmo os sistemas de busca ainda não reconhecem a semântica. E o tempo envolvido para selecionar as fontes ou localizar o documento será muito maior para o usuário. "102 Outro problema é que esses documentos devem ser armazenados em mídias, porém, mesmo as mais modernas mídias digitais têm durabilidade limitada. Os CDs duram em média cinco anos e, se houver algum problema em seu armazenamento (ou até em sua utilização), todos os dados ficam inacessíveis, mesmo os computadores mais comuns usados como servidores, muitas vezes, precisam de reinstalações de sistemas e de espaços liberados. As mídias também avançam e mudam constantemente. Antigamente, os disquetes de oito polegadas armazenavam os dados com eficiência, mas hoje é difícil encontrar um hardware para acessar estas informações. Como atuar Cada vez mais a acumulação documental gerada nesses bancos de dados corporativos e nas instituições precisa ser tratada de uma melhor forma, com o uso de uma classificação. Aqui, é necessária muita criatividade em criar linguagem documentária que o usuário mais comum possa utilizar na hora da produção do documento. O usuário também indexa e “arquiva” o documento. A visão para criar essa linguagem a ser aplicada nos metadados, deve ser a mesma do usuário final, a pessoa que está em algum terminal e que gera um documento, um arquivo ou troca e-mails. É com essa mentalidade que o arquivista deve pensar, como o usuário final. !103 É necessário pensar que o portal corporativo que armazena e troca as informações necessita de uma aplicação de tabela de temporalidade. Não podemos gastar bytes (que acumulam e precisam ser otimizados) com um documento que não tem valor para a administração ou não represente prova de ação ou que não tenha valor futuro. Muitos documentos têm valor quando de sua criação, mas logo são substituídos por outros ou até são incorporados por outra série no fundo. É o controle de versionamento, que na fase de arquivo permanente deve considerar apenas a ultima versão do documento. A multiplicidade de informação nas redes digitais é proporcional ao caos que é um sistema sem planejamento e a preocupação com a classificação. Para solucionar isto é necessário atentarmos para os princípios diplomáticos e de arquivística, como autenticidade e valoração. O principal ator deste ato O arquivista entra com o cérebro, definindo “as regras do negócio”, o perfil de metadados e até a arquitetura de informação de ambientes digitais. E não trabalhando mais como eram feitas o tratamento técnico no tempo do papel. Há um perigo, neste processo, no momento que o usuário final ou algum intermediário possa deixar de classificar de forma devida algum documento que possa servir à administração ou tenha um sentido histórico. Com a folcsonomia (a classificação social) isso pode "104 tornar-se uma realidade em breve. É tão importante que hoje, documentos impressos não-públicos são considerados cópias de arquivos digitais, minimamente classificados por metadados estruturados nos ambientes digitais. É só ver uma batida da Policia Federal. Além dos criminosos serem presos, os computadores sempre aparecem embaixo do braço de um policial nas operações que aparecem nas reportagens da TV. As máquinas têm limitações de espaço e durabilidade. Então a preocupação do arquivista deve ser, além de definir a classificação e a seleção dos arquivos digitais, também pensar num sistema constante de backup, isso para não falar em certificação/assinatura digital. Ou seja, a questão da veracidade é muito importante, assim como imparcialidade e autenticidade dos documentos. A participação dos arquivistas no planejamento do banco de dados começa, portanto, na determinação do fluxo de informação, utilizando o recurso do mapeamento de processos. Arquitetura de Informação Esta participação passa também pelo entendimento da utilização do portal – pensar com a mentalidade do usuário final – e imaginar que, na geração dos arquivos estes devem ser pré-classificados (através de metadados), organizados através de linguagem documentária e que possibilitem uma maior facilidade no futuro processo de seleção. !105 O maior desafio é transmitir aos profissionais da área de tecnologias esses requisitos básicos. E isto é possível ao pensar na arquitetura de informação, na organização lógica das informações e num sistema de indexação eficiente. Assim, devemos ter condições de interferir no processo de planejamento de portais que gerem arquivos e documentos. Devemos pensar como o usuário e facilitar um processo de pré-classificação destes arquivos. Devemos ter condições de planejar a arquitetura de informação destes sistemas para facilitar o acesso às informações digitais. Devemos otimizar o arquivamento de documentos para equacionar a questão de armazenagem e disponibilidade das informações e documentos. São tarefas urgentes e que cabe a nós, profissionais da informação, sua devida execução. O mundo é digital e não podemos deixar de participar desta história. "106 21. Tecnologia da Informação na gestão do conhecimento e informação orgânica Desde que comecei a trabalhar com portais e Gestão do Conhecimento (GC) ouvi muitas confusões entre tecnologia da informação (TI), seus aplicativos e sistemas e as iniciativas de gestão do conhecimento. Estas últimas utilizam-se das ferramentas desenvolvidas pela TI para desempenhar suas atividades. A TI, portanto, é importante instrumento de apoio à incorporação do conhecimento como o principal agregador de valor aos produtos, processos e serviços entregues pelas organizações aos seus clientes. Assim entende-se aqui a TI como um componente importante de GC. Porém, cabe destacar que a TI também é utilizada para determinar a área responsável pelos sistemas (não só informacionais, mas processuais da mesma forma), além da estrutura tecnológica, de produção, de ligação em rede, de comunicação e de logística. Acredito ser importante destacar cada vez mais que a TI, como componente de GC, é responsável pelos sistemas que suportem as atividades de gestão do conhecimento, porém a TI é mais ampla quando analisada do ponto de vista holístico. Este posicionamento é importante, principalmente se notarmos que a TI surgiu antes da GC. Logo, a TI para GC deve ser sempre contextualizada. Assim, pode-se !107 tentar acabar com a confusão típica de solução tecnológica para um programa de GC que engloba muito mais itens. Considera-se GC como a acumulação de recursos, pela mineração de experiências e pelo acesso às informações de outras empresas e instituições, de modo que a empresa possa aumentar a velocidade de desenvolvimento de novos produtos, ampliando o seu ciclo de vida. Assim, percebe-se que a GC não é só TI, mas também gestão da inteligência coletiva, de pessoas com diversas perspectivas, personalidades e caráter diferenciados. Logo, vemos que há uma preocupação de listar a TI como um pilar de GC. Aos profissionais da informação, que atuam ou tentam implementar programas de GC em empresas, cabe o papel de entender a Tecnologia da Informação como um componente importante. E mais, deve-se buscar trabalhar junto às áreas de TI, entendendo seu papel e criando ambientes através do planejamento da estruturação da informação. Lembrese, a área de TI devem-se preocupar com sistemas dos mais variados dentro da empresa, aqueles de missão crítica, de apoio aos negócios, além de estrutura tecnológica e de logística. Ajude as áreas de TI na valorização da gestão e busque respostas para questões de como criar ambientes digitais, com informações estruturadas, para o registro da informação orgânica, gerada pelas pessoas nos processos de trabalho e nas instituições. "108 22. Tem informação de gestão? Coloca no cockpit! No mundo competitivo, cresce a demanda por melhoria de qualidade nos processos. As exigências de qualidade são fatores de sobrevivência das instituições. E, ainda mais, em novas formas de gestão e de organização, como o trabalho em rede. Cabe ao arquivista 2.0 interpretar esta necessidade e transformá-la numa solução. O mundo exige qualidade e as corporações e instituições, por conta disso, enfrentam novos paradigmas em seu ambiente. Os reflexos estão na exigência de qualidade - fator de sobrevivência para as instituições - e nas novas formas de gestão e de organização, como o trabalho em rede. Cabe ao arquivista 2.0 interpretar esta necessidade e transformá-la numa solução. As intranets representam, neste ambiente competitivo e corporativo, a forma de integração dos colaboradores com os objetivos estratégicos das empresas. E mais, a gestão do conhecimento chega como a forma de registrar o capital intelectual, usando as intranets como meio de trabalho. Sabe-se que os programas de qualidade precisam da adoção dos colaboradores. Nada melhor do que usar a intranet para divulgar as atividades dos programas de qualidade. Mas isso pode ir mais além. Que tal !109 possibilitar não só a comunicação, mas a própria administração de métricas no portal? A relação dos portais com a qualidade vai mais além mesmo. Servem como instrumentos de divulgação, mas também como fontes e fornecimento de dados. Os portais corporativos são a própria ferramenta de gerenciamento e relacionamento dos programas de qualidade, apresentando e gerando automaticamente indicadores para os colaboradores. Hoje, este é um ponto de atenção para grandes fornecedores de tecnologia do mercado. A interface do portal tanto capta dados que geram métricas de qualidade de prestação do serviço, expressos em indicadores, como também divulgam estes dados na intranet, democratizando as informações e estimulando a adoção da qualidade na prestação do serviço. Este, acredito, seja o maior papel do portal no mundo da qualidade: facilitar a adoção da qualidade nas empresas. Chego à conclusão de que o relacionamento entre portais e indicadores de qualidade possui diferentes níveis de maturidade. Em alguns casos este relacionamento é de um simples canal de comunicação, o que chamo de geração 1: o portal apoiando a divulgação da qualidade. Em outros casos, a relação entre portais e qualidade é uma via de mão dupla de informações, a geração 2.O: o portal é uma interface de captação e comunicação de informações sobre qualidade. "110 Por último, com as facilidades atuais em ter cockpits e dashboards de diversas fontes de informação, os portais passaram a servir como instrumentos de gestão e participação na qualidade. É a terceira geração na relação entre portais e programas de qualidade. O histórico dessas informações são passíveis de registro. Portanto, exiba seus indicadores e suas metas. Utilize as interfaces e a tecnologia nesse sentido. !111 Posfácio A arquivologia 2.0 não é uma nova ciência, nem um novo modo de ver as informações no contexto das instituições e das pessoas. A arquivologia 2.0 é um manifesto e um alerta para não perdermos o trem da história. Mais do que aspirações científicas, o que nutre esta iniciativa é o desejo de, no futuro, não virarmos meros arqueólogos de bits, nem sermos responsabilizados por perder os registros da informação digital primitiva (esta que geramos agora). Este livro é uma tentativa de trazer à tona novas disciplinas e técnicas possíveis num mundo em constante mutação, com novos paradigmas a respeito das informações. O que acontece neste momento é o contrário do iluminismo, quando a ciência precisou criar um corpus distanciado da realidade para provar sua importância, como afirma Boaventura Santos: "Para atingir um nível qualitativo para a pesquisa científica, agora é necessário aproximar esse conhecimento o máximo possível do conhecimento do senso comum, pois o conhecimento científico pós-moderno só se realiza enquanto tal na medida em que se converte em senso comum”. "112 Ou seja, a ciência passa a fazer parte da sociedade, com uma linguagem própria e comum ao mesmo tempo. Neste cenário, é importante mostrar como a arquitetura de informação, a gestão do conteúdo, o apoio às decisões de gestão, a gestão do conhecimento e tantas outras técnicas mostram um caminho para o arquivista desempenhar suas atividades no mundo 2.0. Mais do que conclusões, busquei trazer à tona práticas que direcionam a atuação do arquivista num universo de informações digitais. Para isso, vale fazer algumas considerações entre esta nova realidade, pragmática e de soluções emergentes e a arquivologia. Numa visão tradicional, mas já considerando a arquivística pós-custodial, vemos que ela preocupa-se com o “conjunto de documentos que, independentemente da natureza ou do suporte, são reunidos por acumulação ao longo das atividades de pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas” (Por Camargo e Bellotto). Este é um elemento importante, pois mostra o quanto evoluímos nosso trabalho da fixação ao suporte para o foco na informação. Mas acredito que isso vá além, pois é de conhecimento dos arquivistas o vínculo da ação para a geração da informação. Mas de que forma esta informação está vinculada a um processo, a um sistema e a um conjunto de pessoas? Neste sentido, Luiz Carlos Lopes apresentou como conceito de arquivo "os acervos compostos por informações orgânicas originais, contidas em !113 documentos registrados em suporte convencional ou em suportes que permitam a gravação eletrônica, mensurável pela sua ordem binária". Nesta abordagem moderna, o suporte é descartado como elemento de objeto da arquivologia. Podemos ver que, de fato, o objeto é a informação orgânica, registrada e gerada nas ações das pessoas. Podemos observar que alguns dos princípios arquivísticos que orientam nosso trabalho e nosso pensamento, como a organicidade, o respeito ao fundo, a cumulatividade e unicidade, são aplicáveis na arquivologia 2.0. Quanto à organicidade, nos ambientes digitais os fluxos informacionais ainda espelham a estrutura, funções e atividades da instituição em todos os contextos. Temos à disposição telas de gerenciamento de fluxos (dashboards), com dados e métricas em relação a sua estrutura e funcionamento. O princípio da proveniência é aplicado diretamente ao conceito de portal corporativo, como plataforma unificadora de relações com os públicos externos e internos das empresas e instituições. Na cumulatividade ainda temos uma formação progressiva, natural e orgânica de informações, seja através de fluxos automatizados dos processos (workflows), seja nos repositórios de conhecimento tácito ou explícito. Quanto à unicidade, as informações são geradas de forma evolutiva e ao longo dos processos, bem como na prática da geração de dossiês e dos processos administrativos. A discussão que se impõe é a incorporação das informações nos seus formatos evolutivos e na classificação em relação "114 a versão final. Mas é imperativo que as macroorientações precisam se adequar a essa dinâmica mais colaborativa. A colaboração corporativa é uma realidade. O advento das redes sociais deixa claro que a utilização dos benefícios do compartilhamento de conhecimento e informações para alcançar resultados é a forma de gerenciar e estimular os fluxos informacionais nas empresas de hoje. Colaboração é a palavra de ordem nas empresas modernas. Cada vez mais os dirigentes percebem o valor agregado nos processos colaborativos, tanto pelas ideias, quanto pelo comprometimento gerado. Uma abordagem arquivística não só é possível como desejada, pois os processos colaborativos cobrem desde ferramentas tecnológicas até estratégias de capacitação e gestão informacional, além de taxonomia a perfilamento de acesso. Uma referência importante é Armando Malheiro da Silva, que afirma, juntamente com seus pares portugueses: "Arquivística é uma ciência de informação social, que estuda os arquivos (como sistemas de informação semifechados), quer na sua estruturação interna e na sua dinâmica própria, quer na interacção com os outros sistemas correlativos que coexistem no contexto envolvente". !115 O arquivo é um sistema de informação (e não somente um fundo), cujo método arquivístico é o caminho de compreensão, interpretação e explicação do contexto de formação dos arquivos e das relações de poder que geraram as informações. Não deve ser um mero conjunto de procedimentos técnicos (descritivos, classificativos e de acesso). A arquivística precisa buscar a inter e transdisciplinaridade. A informação arquivística deve ter uma relação maior com outras ciências, sejam elas tecnologias de informação e comunicação (TIC), técnicas de linguagem documentária da biblioteconomia (como a taxonomia), história (resgate da história oral, por exemplo) e administração para os estudos de processos e sistemas. É nesse contexto que surge a Arquivologia 2.0, que discute como a participação do arquivista no desenho de um portal corporativo pode ser diferente. E na gestão do conhecimento, ou como podemos usar as leis do usuário para pensar numa interface de utilização de informação. No BPM (Business Process Management), o arquivista é capaz de interpretar e desenhar processos de geração e utilização de informações. Num desenho de dashboard, o arquivista deve posicionar-se assim que tiver a oportunidade de planejar uma interface de relação de informações para a tomada de decisão. O arquivista vê a arquitetura de informação não como uma disciplina para criar interfaces bonitas, mas para estruturar os repositórios, sistemas e relação dos colaboradores nas empresas. "116 Se a taxonomia é coisa de bibliotecário, de que forma devemos estruturar a indexação de documentos? E a colaboração e a folcsonomia? Como poderemos saber qual é o documento original com tantas pessoas colocando a mão no conteúdo? E por quê não aplicar uma visão arquivística no planejamento dos metadados? São questões que a Arquivologia 2.0 presta atenção desde já. Como está em nosso manifesto do começo do livro: "Essas novas atividades de geração de informação também geram novos perfis de pessoas: os prosumers, aqueles que produzem e consomem conteúdo e informações. Essa relação se dá em arenas de relacionamento que utilizam ferramentas de web 2.0, como os blogs, wikis, microblogs, ambientes de troca de arquivos”. Aqui o arquivista 2.0 deve pensar na classificação e estruturação da informação, além da própria temporalidade, pois no ambiente digital sempre temos de lembrar a preservação digital e o tamanho limitado dos servidores para registrar as informações. O arquivista 2.0 deve entender a informação orgânica e ver o que se deve fazer com o conteúdo gerado nos blogs, wikis e nas ferramentas de interação humana no mundo digital. Esse novo mundo 2.0 é espelhado através da informação orgânica, registro da inteligência coletiva, das decisões das pessoas, instituições e do relacionamento profissional. É a prova da ação humana e o registro das suas atividades nos processos. Afinal, o arquivista 2.0 deve ser o especialista em informações humanas digitais. !117 "118 Autores que o Arquivista 2.0 lê Tim O´reilley José Maria Jardim Maria Odila Fonseca Armando Malheiro da Silva Fernanda Ribeiro Vanderlei Batista dos Santos Luciana Duranti Terry Cook Rosely Rondinelli Hélio Lodolini Antonia Heredia Hererra Tim BernersLee Schelemberg International Council on Archives Luís Carlos Lopes Boaventura de Souza Santos Johanna Smit Rousseau & Couture Jakob Nielsen Nonaka & Takeuchi Alvin Toffler Thomas Van Der Val Heloisa Belloto Andre Porto Ancona Lopez Marilena Leite Paes CONARQ Ana Maria de Almeida Camargo Le Coadic Charles M. Dollar Zeny Duarte Edgard Morin Ricardo Sodré Andrade Kira Tarapanoff Ramón Cruz Mundet Menne Haritz Chun José Aldo Barreto Wei Choo Chris Anderson A nuvem de nomes de autores indicam autores que ajudam na formação do arquivista 2.0. !119 O que difere o Mundo 1.0 do 2.0 é a atitude. "120