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Rasheed Abou-Alsamh Rasheed Abou-Alsamh
Rasheed Abou-Alsamh, jornalista e colunista Foto: Reprodução Twitter

Aspa cria mais laços entre países árabes e sul-americanos

Maduro está desesperado para ver preço do petróleo subir, já que depende das exportações para financiar seus programas sociais

A Quarta Cúpula dos Países Árabes e Sul-Americanos (Aspa) acaba de se encerrar em Riad, a capital da Arábia Saudita. O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, representou o Brasil, uma pequena decepção para os anfitriões sauditas, que queriam a presença da presidente Dilma Rousseff. Mas, com a montanha de problemas que ela enfrenta em casa, os sauditas certamente entenderam por que ela não pôde vir.

Mas não faltaram líderes do alto escalão para essa cúpula. O rei saudita Salman bin Abdulaziz al-Saud recebeu no aeroporto de Riad na terça-feira o governante de Dubai, Sheikh Mohammad bin Rashid Al-Makhtoum; o rei Abdullah da Jordânia; o presidente do Egito, Abdel Fattah Al-Sisi; o presidente Nicolás Maduro, da Venezuela, e o presidente Rafael Correa, do Equador, entre outros.

Para os sauditas, essa cúpula foi um grande acontecimento, que serviu para unir mais os países árabes aos da América do Sul, mesmo que, para o observador de fora, não tenha sido tomada nenhuma decisão dramática. Como toda reunião de alto escalão, o que é dito atrás de portas fechadas é sempre mais importante do que o que é anunciado ao mundo. Observadores políticos tinham certeza que Maduro e Correa iam discutir o baixo preço do petróleo — que continua abaixo de US$ 50 o barril — com os sauditas, uns dos maiores produtores do mundo. Durante o segundo dia da cúpula, na quarta-feira, Maduro foi visto deixando a sala principal do plenário para se encontrar com o ministro saudita do petróleo, Ali al-Naimi. Nenhuma declaração foi divulgada sobre essa reunião; então, não sabemos o clima da conversa. Mas, certamente, a Venezuela está desesperada por querer ver o preço do petróleo subir, já que depende quase exclusivamente das receitas das exportações do produto para financiar seus programas sociais. Maduro deixou Riad sem ter qualquer garantia dos anfitriões de cortar a produção deles: os sauditas têm deixado bem claro que não vão perder a sua fatia do mercado cortando produção numa tentativa de puxar o preço do barril para cima.

No caso do Brasil, a cúpula serviu para reafirmar a posição de maior exportador sul-americano para a Arábia Saudita e os demais países do mundo árabe. A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, esteve em Riad por dois dias antes da cúpula para presenciar o anúncio do fim da proibição da importação de carne bovina brasileira no reino. Ela disse que tinha a perspectiva de atingir até US$ 170 milhões em exportações para a Arábia Saudita e que outros países árabes também iam importar mais carne brasileira, seguindo os sauditas.

O chanceler Vieira reiterou a posição brasileira de acolher refugiados da Síria, dizendo que o Brasil já tinha emitido oito mil vistos para sírios, e que mais de dois mil já tinham chegado. “A fundação da Aspa foi inspirada pelo nosso ex-presidente Lula, e é uma associação que ainda apoiamos fortemente,” disse ele ao fim da cúpula. A Aspa foi lançada em 2005 em Brasília. “Temos 16 milhões de brasileiros de ascendência árabe vivendo em paz e totalmente integrados à sociedade brasileira,” ele acrescentou. Vieira disse que muito mais ainda pode ser feito para desenvolver as relações entre os países da América do Sul e os árabes, ainda que o volume de comércio entre as duas regiões tenha dobrado nos últimos dez anos.

A Declaração de Riad, de 23 páginas na versão em inglês, dedicou várias páginas para reiterar o apoio de todos os 34 países presentes à cúpula à criação de um Estado palestino independente nos territórios ocupados por Israel em 1967. E pediu que estados membros da Aspa não comprem produtos feitos em assentamentos israelenses nos territórios palestinos. Também condenou o terrorismo e pediu que o Irã devolvesse as três ilhas no Golfo Pérsico aos Emirados Árabes Unidos. No âmbito sul-americano, pediu que a Argentina e o Reino Unido retomem negociações para achar uma solução pacífica para a questão das Ilhas Malvinas.

Na área de cooperação cultural, já há em São Paulo a Biblioteca e Centro de Pesquisa América do Sul-Países Árabes, ou BibliASPA. Esse centro publica livros bilíngues em árabe e português ou espanhol, organiza festivais de cinema árabe e oferece aulas de português a refugiados árabes no Brasil. Na Argélia, uma biblioteca árabe-sul-americana esta sendo construída a partir de um projeto de Oscar Niemeyer.

A próxima cúpula da Aspa vai ser em 2018, em Caracas. Ainda resta muito trabalho a fazer para expandir o comércio entre os países sul-americanos e árabes. Mas igualmente importante seria uma expansão dos laços culturais. É muito importante expandir a troca de exibições de obras de arte e de filmes entre a duas regiões para cada povo aprender mais sobre os costumes, hábitos e crenças dos outros. Somente assim poderemos realmente dizer que existe uma união verdadeira entre as duas regiões tão distantes uma da outra, e de culturas muito diferentes.

Rasheed Abou-Alsamh é jornalista

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